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Vivendo no Novo Reino (Mateus 18—25)

Comentário Bíblico / Produzido por Projeto Teologia do Trabalho
Living new kingdom

Nos capítulos 18 a 25 do Evangelho de Mateus, Jesus apresenta imagens concretas de como é a vida no reino de Deus. Em muitos casos, essas imagens se aplicam particularmente ao trabalho.

Resolução de conflitos (Mateus 18.15-35)

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Todos os locais de trabalho experimentam conflitos. Nesta passagem, Jesus nos dá um modelo para lidar com alguém que nos prejudicou. Ele não diz “vingue-se!” ou “revide!”. Em vez disso, apresenta um processo que começa com a busca individual da reconciliação. A bem-aventurança da humildade (Mt 5.5) significa deixar sua autojustificação de lado por tempo suficiente para que você possa se expressar de maneira respeitosa e factual à pessoa que o feriu, bem como para se abrir à perspectiva dela (Mt 18.15). Isso não significa submeter-se a mais abusos, mas abrir-se para a possibilidade de que sua percepção não seja universal. Mas suponha que isso não resolva o conflito. O segundo passo alternativo é pedir a pessoas que conhecem ambas as partes que o acompanhem enquanto você retoma o problema com a pessoa que lhe causou dor ou feriu-o. Se o conflito ainda não for resolvido, leve o assunto à liderança (a igreja, em Mateus 18.16, passagem que aborda especificamente o conflito na igreja) para um julgamento imparcial. Se esse julgamento não resolver o problema, o ofensor que não acatá-lo deve ser removido da comunidade (Mt 18.17).

Embora Jesus estivesse falando sobre conflito com outro membro da igreja (Mt 18.15), seu método é um notável precursor daquela que agora é reconhecida como a melhor prática a ser adotada no local de trabalho. Mesmo os melhores ambientes de trabalho vivenciam conflitos. Quando isso acontece, a única solução eficaz é que aqueles em desacordo conversem diretamente, em vez de reclamarem com outros. Em lugar de tornar público um conflito pessoal, converse com a pessoa em particular. Na era da comunicação eletrônica, a abordagem de Jesus é mais importante do que nunca. Basta um ou dois nomes na linha “cc:” ou um toque no botão “responder a todos” para transformar uma simples diferença em uma briga no escritório. Mesmo que duas pessoas consigam manter a troca de e-mails apenas entre si, as possibilidades de mal-entendidos se multiplicam quando um meio impessoal, como o e-mail, é usado. Talvez seja melhor seguir o conselho de Jesus de forma literal: “Vá e, a sós com ele, mostre-lhe o erro” (Mt 18.15).

Apontar falhas é uma via de mão dupla. Também precisamos estar abertos a ouvir as falhas que nos são atribuídas. Ouvir — Jesus menciona três vezes a palavra “ouvir” nesses três versículos — é o elemento crucial. Os modelos contemporâneos de resolução de conflitos geralmente se concentram em fazer com que as partes se ouçam, preservando a opção de discordarem. É comum que a escuta atenta leve à descoberta de uma resolução mutuamente aceitável. Caso contrário, outras pessoas com as habilidades e a autoridade apropriadas são convidadas a se envolver.

O jovem rico (Mateus 19.16-30)

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A questão do dinheiro, discutida anteriormente em Mateus 6, surge novamente aqui, com a história do jovem rico que foi atraído a Jesus. O jovem pergunta a Jesus: “Mestre, que farei de bom para ter a vida eterna?”. Jesus lhe diz que guarde os mandamentos, e ele responde que já tem feito isso. Um elemento distintivo na narrativa de Mateus é que o jovem então pergunta a Jesus: “O que me falta ainda?”. Ele mostra grande perspicácia ao fazer essa pergunta. Podemos fazer tudo que parece certo, e ainda assim ter consciência de que algo não está certo. Jesus responde: “Venda os seus bens e dê o dinheiro aos pobres, e você terá um tesouro nos céus. Depois, venha e siga-me” (Mt 19.21).

Sabemos pelos quatro Evangelhos que Jesus não chamou todos os seus ouvintes a doarem todos os seus bens. Nem todas as pessoas estão de tal forma sobrecarregadas por suas posses quanto esse jovem estava. Em seu caso, o desafio foi radical em razão de seu forte apego à riqueza (Mt 19.22). Deus sabe exatamente o que está em nosso coração e o que é necessário para que o sirvamos.

Estaria nosso tesouro em coisas como trabalho, emprego, desempenho, habilidades e fundos de aposentadoria? Essas coisas são boas (presentes de Deus) em seu devido lugar. Mas são secundárias quando se trata de buscar em primeiro lugar o reino de Deus (Mt 6.33) e um relacionamento correto (justo) com Deus e com os outros. Devemos preservar nossa riqueza e nosso trabalho com as mãos abertas, para que, como o jovem rico, não acabemos lamentavelmente nos afastando de Deus. (Essa história é discutida em maior profundidade nos comentários de Marcos 10.17-31 e Lucas 18.18-30 em www.teologiadotrabalho.org.)

Os trabalhadores da vinha (Mateus 20.1-16)

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Esta parábola é exclusiva do Evangelho de Mateus. O proprietário de uma vinha contrata diaristas em vários horários ao longo do dia. Os contratados às seis horas da manhã trabalham um dia inteiro. Os contratados às cinco horas da tarde trabalham apenas uma hora. Mas o proprietário paga a todos o salário de um dia inteiro (um denário). Ele faz questão de garantir que todos saibam que todos são pagos da mesma forma, apesar da quantidade diferente de horas trabalhadas. Não é surpresa que os primeiros contratados reclamem ao proprietário por trabalharam mais tempo sem ganhar mais que aqueles que começaram no final do dia. “Mas ele respondeu a um deles: ‘Amigo, não estou sendo injusto com você. Você não concordou em trabalhar por um denário? [...] Não tenho o direito de fazer o que quero com o meu dinheiro? Ou você está com inveja porque sou generoso?’ Assim, os últimos serão primeiros, e os primeiros serão últimos” (Mt 20.13,15-16).

Ao contrário da parábola do semeador (Mt 13.3-9; 18-23), Jesus não nos dá uma interpretação explícita. Como resultado, os estudiosos já ofereceram muitas interpretações. Como as pessoas da história são trabalhadores e gerentes, alguns supõem que ela trata de trabalho. Nesse caso, parece dizer “não compare seu salário com o dos outros” ou “não fique insatisfeito se os outros receberem mais ou trabalharem menos do que você em um cargo semelhante”. Pode-se argumentar se essas são de fato boas práticas para os trabalhadores. Se você ganha um salário decente, por que sentir-se infeliz pelo fato de outros terem um salário melhor? Mas essa interpretação da parábola também pode ser usada para justificar práticas trabalhistas injustas ou abusivas. Alguns trabalhadores podem receber salários mais baixos por razões injustas, como raça, sexo ou condição de imigrante. Jesus estaria dizendo que devemos nos contentar quando nós ou outros trabalhadores são tratados injustamente?

Além disso, pagar o mesmo às pessoas, independentemente do volume de trabalho realizado, é uma prática comercial questionável. Não seria um forte incentivo para todos os trabalhadores aparecerem às cinco horas da tarde do dia seguinte? E que tal tornar pública a remuneração de todos? Isso de fato reduziria o escopo para intrigas. Mas seria uma boa ideia forçar aqueles que trabalham mais horas a assistir àqueles que trabalharam apenas uma hora receberem um salário idêntico? Parece algo calculado para causar conflitos trabalhistas. Pagar por desempenho inferior, para levar a parábola ao pé da letra, não parece ser uma receita para o sucesso nos negócios. Será que Jesus realmente defende essa prática de pagamento?

Talvez a parábola não seja realmente sobre trabalho. O contexto geral é que Jesus está dando exemplos surpreendentes daqueles que pertencem ao reino de Deus: por exemplo, crianças (Mt 19.14), que legalmente nem sequer são donas de si mesmas. Ele deixa claro que o reino não pertence aos ricos, ou pelo menos não a muitos deles (Mt 19.23-26). Pertence àqueles que o seguem, especialmente se sofrerem perdas. “Muitos primeiros serão últimos, e muitos últimos serão primeiros” (Mt 19.30). A presente parábola é seguida imediatamente por outra que termina com as mesmas palavras: “Os últimos serão primeiros, e os primeiros serão últimos” (Mt 20.16). Isso sugere que a história é uma continuação da discussão em torno daqueles a quem o reino pertence. A entrada no reino de Deus não é conquistada por trabalho ou ação de nossa parte, mas pela generosidade de Deus.

Mesmo entendendo que a parábola trata da generosidade de Deus no reino dos céus, ainda assim podemos perguntar como ela se aplica ao trabalho. Se você está sendo pago de forma justa, o conselho sobre se contentar com seu salário permanece. Se outro trabalhador recebesse um benefício inesperado, não seria elegante se alegrar, em vez de resmungar?

Mas há também uma aplicação mais ampla. Na parábola, o proprietário paga a todos os trabalhadores o suficiente para que sustentem sua família. [1] A situação social nos dias de Jesus forçava muitos pequenos agricultores a deixarem suas terras por causa de dívidas contraídas para pagar os impostos romanos. Isso violava a ordem do Deus de Israel segundo a qual a terra não poderia ser tirada de quem a cultivasse (Lv 25.8-13), mas isso sem dúvida não tinha importância para os romanos. Consequentemente, grandes grupos de homens desempregados se formavam todas as manhãs, na esperança de que fossem contratados para o dia. Eles eram os trabalhadores deslocados, desempregados e subempregados de sua época. Aqueles que ainda esperavam às cinco horas da tarde tinham poucas chances de ganhar o suficiente para comprar comida para a família naquele dia. No entanto, o proprietário da vinha paga até mesmo a esses o salário de um dia inteiro.

Se o proprietário da vinha representa Deus, então essa é uma mensagem poderosa que proclama que, no reino de Deus, trabalhadores deslocados e desempregados encontram um trabalho que atende a suas necessidades e às daqueles que dependem deles. Já ouvimos Jesus dizer que “o trabalhador é digno do seu sustento” (Mt 10.10). Isso não significa necessariamente que os empregadores terrenos tenham a responsabilidade de atender a todas as necessidades de seus funcionários. Os empregadores terrenos não são Deus. Em vez disso, a parábola é uma mensagem de esperança para todos que lutam a fim de encontrar um emprego adequado. No reino de Deus, todos encontraremos um trabalho que atenda a nossas necessidades. A parábola também é um desafio para aqueles que participam da formação das estruturas de trabalho na sociedade de hoje. Os cristãos podem fazer algo para promover esse aspecto do reino de Deus neste momento?

Liderança servidora (Mateus 20.20-28)

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Apesar dessa parábola sobre a graça e a generosidade de Deus, apesar de ouvir Jesus comentar duas vezes que os primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros, os discípulos de Jesus ainda não tinham entendido a questão. A mãe de Tiago e de João pede a Jesus que conceda a seus dois filhos os lugares de maior destaque em seu reino vindouro. Os dois homens estão ali, e Jesus se volta para eles e pergunta: “Podem vocês beber o cálice que eu vou beber?”. Eles respondem: “Podemos”. “Quando os outros dez discípulos ouviram isso, ficaram indignados”. Jesus aproveita essa oportunidade para questionar suas noções de proeminência.

Vocês sabem que os governantes das nações as dominam, e as pessoas importantes exercem poder sobre elas. Não será assim entre vocês. Ao contrário, quem quiser tornar-se importante entre vocês deverá ser servo, e quem quiser ser o primeiro deverá ser escravo; como o Filho do homem, que não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos. (Mt 20.25-28)

A verdadeira liderança é encontrada no servir aos outros. A forma como isso acontece varia de acordo com o local de trabalho e a situação. Isso não significa que um CEO deva varrer o chão ou limpar os banheiros uma vez por mês, nem que qualquer trabalhador possa usar a ajuda a outra pessoa como desculpa para não fazer bem o seu trabalho. Significa, sim, que realizamos nosso trabalho com o objetivo de servir a clientes, colegas de trabalho, acionistas e outras pessoas a quem nosso trabalho afeta. Max De Pree foi por muito tempo CEO da Herman Miller e membro do Hall da Fama da Fortune. Ele escreveu em seu livro Liderar é uma arte: “A primeira responsabilidade de um líder é definir a realidade. A última é agradecer. Entre as duas, o líder deve se tornar um servo e um devedor. Isso resume o progresso de um líder habilidoso”. [1]

O servo é a pessoa que conhece sua pobreza espiritual (Mt 5.3) e exerce poder sob o controle de Deus (Mt 5.5) para manter relacionamentos corretos. O líder-servo pede desculpas por seus erros (Mt 5.4), mostra misericórdia quando outros falham (Mt 5.7), promove a paz quando possível (Mt 5.9) e suporta críticas imerecidas ao tentar servir a Deus (Mt 5.10) com integridade (Mt 5.8). Jesus estabeleceu o padrão em suas próprias ações em nosso favor (Mt 20.28). Mostramos que somos seguidores de Cristo ao seguir seu exemplo.

A Parábola dos Dois Filhos (Mateus 21.28-32)

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A parábola dos dois filhos (Mt 21.28-32) é a história de dois irmãos que ouvem do pai que devem ir trabalhar em sua vinha. Um diz ao pai que o fará, mas não o faz. O outro diz ao pai que não vai, mas acaba trabalhando o dia todo entre as videiras. Jesus então faz a seguinte pergunta: “Qual dos dois fez a vontade do pai?”. A resposta é clara: aquele que de fato trabalhou, embora inicialmente tivesse se recusado a fazê-lo. Essa parábola é uma continuação de histórias anteriores em Mateus sobre as pessoas que realmente fazem parte do reino de Deus. Dirigindo-se aos líderes religiosos presentes em sua audiência, Jesus diz que “os publicanos e as prostitutas estão entrando antes de vocês no Reino de Deus” (Mt 21.31). [1] As pessoas que parecem menos religiosas entrarão no reino de Deus à frente dos líderes religiosos, porque, no final, farão a vontade de Deus.

No trabalho, isso nos lembra que as ações falam mais alto que as palavras. Muitas organizações têm declarações de missão que afirmam que seus principais objetivos são atendimento ao cliente, qualidade do produto, integridade diante do Estado, e a primazia de seu pessoal entre outras coisas do gênero. No entanto, muitas dessas organizações deixam a desejar no serviço, na qualidade, na integridade e na relação com os funcionários. Os indivíduos podem fazer a mesma coisa, exaltando seus planos mas falhando em sua implementação. Organizações e indivíduos que caem nessa armadilha podem ter boas intenções e talvez não reconheçam que estão deixando de praticar sua retórica. Os locais de trabalho precisam tanto de sistemas eficazes para implementar sua missão e objetivos como sistemas de monitoramento imparciais para fornecer feedback confiável.

A Parábola dos Lavradores (Mateus 21.33-41)

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A parábola contada logo em seguida é a dos lavradores perversos (Mt 21.33-41), que se passa em um local de trabalho, a saber, uma vinha. No entanto, Jesus deixa claro que ele não está falando sobre administrar uma vinha, mas sobre a rejeição e o assassinato dos quais seria vítima por instigação das autoridades religiosas judaicas de sua época (Mt 21.45). A chave para aplicá-la ao local de trabalho de hoje é o versículo 43: “O Reino de Deus será tirado de vocês e será dado a um povo que dê os frutos do Reino”. Todos nós recebemos responsabilidades no trabalho. Se nos recusarmos a cumpri-las em obediência a Deus, estaremos trabalhando em desacordo com o reino de Deus. Em todo trabalho, nossa derradeira avaliação de desempenho vem de Deus.

O Grande Mandamento é uma Grande Estrutura (Mateus 22.34-40)

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Os líderes judeus dos dias de Jesus debatiam com frequência sobre a importância relativa dos mandamentos. Alguns sustentavam que a observância do sábado era o mais importante deles. Outros valorizavam a circuncisão acima de tudo. Ainda outros acreditavam, como muitos judeus modernos acreditam hoje, que o mandamento mais importante é encontrado em Deuteronômio 6.5: “Ame o Senhor, o seu Deus, de todo o seu coração, de toda a sua alma e de todas as suas forças”.

Portanto, quando um perito da lei pede a Jesus que pondere sobre a questão “qual é o maior mandamento da Lei?” (Mateus 22.36), poderia estar pedindo a Jesus que escolhesse um lado em um debate já contencioso.

No entanto, Jesus mergulha em uma nova área de discernimento, respondendo não apenas qual mandamento é o maior, mas apresentando como as pessoas poderiam cumpri-lo. “Ame o Senhor, o seu Deus, de todo o seu coração, de toda a sua alma e de todo o seu entendimento”, diz Jesus, acrescentando um segundo mandamento — de Levítico 19.18, “ame cada um o seu próximo como a si mesmo” — que ele une ao primeiro ao dizer que é “semelhante a ele”. (Veja o Comentário Bíblico PTT sobre Levítico 19.17-18). Pela lógica de Jesus, amar a Deus está ligado de forma indissociável a amar as pessoas. João ecoa essa declaração quando diz que “se alguém afirmar: ‘Eu amo a Deus’, mas odiar seu irmão, é mentiroso” (1Jo 4.20).

O trabalho é uma das principais maneiras pelas quais podemos amar as pessoas. O local de trabalho costuma ser o lugar onde encontramos a maior diversidade de pessoas, e sua proximidade conosco, dia após dia, lança-nos o desafio único de amar pessoas diferentes de nós. Também amamos os outros por meio do trabalho quando ele atende às necessidades importantes dos clientes ou de outras partes interessadas. Para obter mais exemplos, consulte Nosso trabalho cumpre o maior mandamento (Mc 12.28-34) e O bom samaritano em ação – amando o próximo como a si mesmo (Lc 10.25-37).

Jesus, porém, não apenas nos ordena que amemos os outros, mas que amemos os outros como amamos a nós mesmos. Como isso se dá no local de trabalho? É a atitude de uma cozinheira que verifica duas vezes a temperatura interna de um hambúrguer depois que alguém diz “isso parece bom para você?”, porque é o que ela faria se preparasse o hambúrguer para si mesma. É um vendedor que chama um colega mais experiente quando um cliente faz uma pergunta para a qual ele não tem certeza de saber a resposta — em vez de dar uma resposta que ele supõe ser a certa — porque ele mesmo gostaria de obter essa informação antes de fechar a compra. É um mecânico que refaz o trabalho no freio que ele acabou de concluir porque ouviu um barulho estranho e é isso que ele faria antes de dirigir seu próprio carro. É um empresário perguntando a seus colegas: “É possível que não a estejamos levando a sério o suficiente pelo fato de ela ser mulher?”, ciente de que gostaria que um colega o defendesse quando ele estivesse sendo incompreendido.

Esses são pequenos exemplos, mas cada um deles pode ter um preço — uma comissão perdida, uma hora de tempo não faturável, uma noite de sono curta, perda de acesso ao círculo interno do poder. Nosso trabalho como um todo tem o potencial de servir e, portanto, amar o próximo. Contudo, amar o próximo como a si mesmo pode exigir riscos que certamente correríamos para servir nossos próprios fins, mas que se agigantam quando são assumidos apenas em benefício de outra pessoa. É realmente um padrão alto, e talvez essa seja a razão de Jesus unir “ame o seu próximo como a si mesmo” a “ame o Senhor” no Grande Mandamento.

A Parábola do Servo Fiel (Mateus 24.45-51)

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Esta parábola é sobre um servo que foi encarregado de toda a casa, o que incluía a responsabilidade de dar a outros servos sua porção de alimento no tempo devido. Jesus diz: “Feliz o servo que seu senhor encontrar fazendo assim quando voltar” (Mt 24.46). Esse servo será promovido e assumirá uma responsabilidade adicional. Em contrapartida, Jesus observou:

Mas suponham que esse servo seja mau e diga a si mesmo: “Meu senhor está demorando”, e então comece a bater em seus conservos e a comer e a beber com os beberrões. O senhor daquele servo virá num dia em que ele não o espera e numa hora que não sabe. Ele o punirá severamente e lhe dará lugar com os hipócritas, onde haverá choro e ranger de dentes. (Mt 24.48-51)

Em um contexto de trabalho moderno, o servo da parábola seria equivalente a um gerente com um dever para com os proprietários enquanto gerencia outros trabalhadores. Os interesses do proprietário são atendidos apenas quando as necessidades dos trabalhadores são atendidas. O gerente tem responsabilidades para com aqueles que estão acima e abaixo dele em termos de autoridade. Jesus diz que é dever do líder-servo estar atento às necessidades daqueles que estão tanto abaixo quanto acima dele. Não pode justificar os maus-tratos àqueles sob sua autoridade alegando que isso de alguma forma visa ao benefício de seus superiores. Jesus retrata essa realidade de forma dramática na punição aplicada ao trabalhador que se preocupa apenas com os próprios interesses (Mt 24.48-51).

A Parábola dos Talentos (Mateus 25.14-30)

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Uma das parábolas mais significativas de Jesus a respeito do trabalho tem como contexto os investimentos (Mt 25.14-30). Um homem rico delega a administração de sua riqueza a seus servos, assim como fazem os investidores nos mercados de hoje. Ele dá cinco talentos (uma grande soma de dinheiro) [1] ao primeiro servo, dois talentos ao segundo e um talento ao terceiro. Dois dos servos ganham 100% de retorno negociando os fundos, mas o terceiro servo esconde o dinheiro no chão e não ganha nada. O rico volta, recompensa os dois que ganharam dinheiro, mas pune severamente o servo que não fez nada.

O significado da parábola vai muito além dos investimentos financeiros. Deus deu a cada pessoa uma grande variedade de dons e espera que os empreguemos em seu serviço. Não é aceitável simplesmente colocar esses presentes na prateleira do armário e ignorá-los. Assim como os três servos, não temos dons do mesmo grau. O retorno que Deus espera de nós é proporcional aos dons que recebemos. O servo que recebeu um talento não foi condenado por não alcançar a meta de cinco talentos; ele foi condenado por não fazer nada com o que lhe foi dado. O dons que recebemos de Deus incluem aptidões, habilidades, conexões familiares, posições sociais, educação, experiências e muito mais. O ponto da parábola é que devemos usar tudo que nos foi dado para os propósitos de Deus. As graves consequências para o servo improdutivo, muito além de qualquer coisa desencadeada pela pura mediocridade nos negócios, nos dizem que devemos investir nossa vida, não desperdiçá-la.

No entanto, o talento específico investido na parábola é dinheiro, da ordem de um milhão de dólares americanos em valores atuais. Em nosso idioma, essa informação é perdida, uma vez que a palavra talento passou a se referir principalmente a habilidades ou aptidões. Mas essa parábola diz respeito ao dinheiro. Ela mostra o investimento, e não a acumulação, como algo piedoso a se fazer, contanto que ele cumpra propósitos piedosos de maneira piedosa. No final, o mestre elogia os dois servos de confiança com as palavras “muito bem, servo bom e fiel!” (Mt 25.23). Vemos nessas palavras que o mestre se preocupa com os resultados (“muito bem”), os métodos (“bom”) e a motivação (“fiel”).

Apontando mais especificamente para o local de trabalho, a parábola recomenda colocar o capital em risco em busca de retorno. Às vezes, os cristãos falam como se o crescimento, a produtividade e o retorno do investimento fossem profanos para Deus. Mas essa parábola derruba essa ideia. Devemos investir habilidades e aptidões, bem como riqueza e recursos disponibilizados a nós no trabalho, enfim, tudo para os assuntos do reino de Deus. Isso inclui a produção de bens e serviços necessários. O voluntário que ensina na escola dominical está cumprindo essa parábola. O mesmo acontece com o empresário que abre um novo negócio e dá emprego a outras pessoas, o administrador de serviços de saúde que inicia uma campanha de conscientização sobre a AIDS e o operador de máquina que desenvolve uma inovação de processo.

Deus não concede às pessoas dons idênticos ou necessariamente iguais. Se fizer o melhor que puder com os dons dados a você por Deus, ouvirá seu “muito bem”. Não apenas os dons, mas também as pessoas têm o mesmo valor. Ao mesmo tempo, a parábola termina com o talento retirado do terceiro servo sendo dado ao que tinha dez talentos. Valor igual não significa necessariamente compensação igual. Algumas posições exigem mais habilidade ou aptidão e, portanto, são compensadas de acordo. Os dois servos que se saíram bem são recompensados ​​com quantias diferentes. Mas ambos são elogiados de forma idêntica. A implicação da parábola é que devemos usar todos os talentos que nos foram dados da melhor maneira possível para a glória de Deus e, quando assim fizermos, estaremos em igualdade de condições com outros servos de Deus fiéis e confiáveis.

Para uma discussão da parábola muito semelhante das dez minas, ver Lucas 19.11-27 em Lucas e o Trabalho em www.teologiadotrabalho.org.

Para ler mais sobre dons e chamado, consulte Visão geral do chamado e da vocação. Para ler mais sobre como usar nossos dons em comunidade, consulte Comunidades repletas de dons (1Coríntios 12.1—14.40).

Ovelhas e bodes (Mateus 25.31-46)

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O ensinamento final de Jesus nesta seção examina o tratamento que damos aos necessitados. Segundo este relato, quando Jesus voltar em sua glória, ele se sentará em seu trono e separará as pessoas “como o pastor separa as ovelhas dos bodes” (Mt 25.32). A separação se baseia em como tratamos as pessoas necessitadas. Para as ovelhas, ele diz:

Venham, benditos de meu Pai! Recebam como herança o Reino que foi preparado para vocês desde a criação do mundo. Pois eu tive fome, e vocês me deram de comer; tive sede, e vocês me deram de beber; fui estrangeiro, e vocês me acolheram; necessitei de roupas, e vocês me vestiram; estive enfermo, e vocês cuidaram de mim; estive preso, e vocês me visitaram. (Mt 25.34-36)

Essas são todas pessoas necessitadas, a quem as ovelhas serviram, pois Jesus diz: “O que vocês fizeram a algum dos meus menores irmãos, a mim o fizeram” (Mt 25.40). Para os bodes, ele diz:

Malditos, apartem-se de mim [...]. Pois eu tive fome, e vocês não me deram de comer; tive sede, e nada me deram para beber; fui estrangeiro, e vocês não me acolheram; necessitei de roupas, e vocês não me vestiram; estive enfermo e preso, e vocês não me visitaram [...]. O que vocês deixaram de fazer a alguns destes mais pequeninos, também a mim deixaram de fazê-lo. (Mt 25.41-43,45)

Somos chamados, individual e coletivamente, a ajudar os necessitados. Nossa vida está “firmemente segura como a dos que são protegidos pelo Senhor” (1Sm 25.29), e não podemos ignorar a situação dos seres humanos que sofrem fome, sede, nudez, falta de moradia, doença ou prisão. Trabalhamos para atender a nossas próprias necessidades e às daqueles que dependem de nós; mas também trabalhamos para ter algo para dar aos necessitados (Hb 13.1-3). Unimo-nos a outras pessoas para encontrar maneiras de nos aproximarmos daqueles que não têm as coisas básicas da vida, as quais podemos considerar como certas. Se as palavras de Jesus nesta passagem forem levadas a sério, mais coisas do que imaginamos podem depender de nossa caridade.

Jesus não diz exatamente como as ovelhas serviram aos necessitados. Pode ter sido por meio de doações e trabalho de caridade. Mas talvez parte disso tenha sido realizado por meio do trabalho comum de cultivar e preparar alimentos e bebidas; ajudar os novos colegas a se familiarizarem com o trabalho; projetar, fabricar e vender roupas. Todo trabalho legítimo serve às pessoas que precisam dos produtos e serviços do trabalho e, ao fazê-lo, ele também serve a Jesus.