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Contos de dois reinos (Mateus 11—17)

Comentário Bíblico / Produzido por Projeto Teologia do Trabalho
Two kingdoms

O meu jugo é suave (Mateus 11.28-30)

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À medida que caminhamos pelo Evangelho de Mateus, vemos que a oposição a Jesus — sua mensagem e suas ações — está aumentando. Ela chega ao ápice em Mateus 12.14, diante da decisão dos líderes religiosos de pará-lo, ainda que isso significasse ter de matá-lo. Isso prefigura e dá início ao final para o qual a narrativa inteira está apontando: a crucificação de Jesus em Jerusalém. Ciente do que o espera no futuro, Jesus ainda assim diz aos seus seguidores:

Venham a mim, todos os que estão cansados e sobrecarregados, e eu lhes darei descanso. Tomem sobre vocês o meu jugo e aprendam de mim, pois sou manso e humilde de coração, e vocês encontrarão descanso para as suas almas. Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve. (Mateus 11.28-30)

Se realizarmos nosso trabalho em união com ele, encontraremos satisfação e experimentaremos bons relacionamentos com Deus e com as pessoas.[1] Quando Deus deu uma tarefa para Adão realizar no Jardim do Éden, o trabalho era suave e o fardo era leve sob a autoridade de Deus. Quando o casal humano se rebelou contra seu Criador, o caráter do trabalho mudou para uma labuta pesada contra espinhos e ervas daninhas (Gênesis 3). Jesus nos convida a trabalhar em parceria com ele com a promessa de descanso para a nossa alma. (Você encontrará mais sobre trabalhar juntamente com Cristo em “2Coríntios 6.14-18” em 2Coríntios e o trabalho, em www.teologiadotrabalho.org.)

Trabalho no sábado (Mateus 12.1-8)

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Uma das principais áreas de conflito entre Jesus e seus oponentes era a questão da guarda do sábado. Nesta passagem, Jesus é criticado pelos líderes religiosos por permitir que seus seguidores colhessem e comessem grãos no sábado. Os fariseus consideravam que isso era um trabalho, o que era proibido no sábado. Jesus despreza tanto a interpretação quanto a motivação deles. Ele argumenta que colher apenas grãos suficientes para satisfazer a fome imediata não é uma quebra do sábado, porque tanto o rei Davi quanto os sacerdotes do templo fizeram isso sem incorrer numa repreensão por parte de Deus (Mateus 12.3-5). Além do mais, a verdadeira fidelidade à lei de Moisés deveria ser motivada pela compaixão e pela misericórdia (Mateus 12.6). O amor de Deus pela misericórdia (permitir que pessoas famintas colhessem grãos para comer) é maior do que o desejo de Deus pelos sacrifícios (seguir as regulamentações do sábado), como já havia sido revelado em Miqueias 6.6-8. O presente de um dia de descanso a cada semana é uma promessa de Deus de que não temos de trabalhar incessantemente apenas para nos sustentar. Não é um julgamento contra aliviar a fome ou a necessidade de alguém no sábado.

A conexão entre o sábado judaico e a adoração cristã no domingo, bem como a aplicação da lei do sábado judaico à vida cristã, são discutidas em maior profundidade nas seções “Marcos 1.21-45” e “Marcos 2.23—3.6” em Marcos e o trabalho, nas seções “Lucas 6.1-11; 3.10-17” em Lucas e o trabalho e no artigo Descanso e trabalho em www.teologiadotrabalho.org.

Parábolas do Reino (Mateus 13)

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A partir do capítulo 13, em razão da oposição, o estilo de ensino de Jesus muda. Em vez de proclamar o Reino claramente, ele começa a falar por meio de parábolas, as quais são significativas para os crentes, mas incompreensíveis para os descrentes. A maioria dessas histórias breves tem relação com trabalhadores: um semeador lançando sementes (Mateus 13.3-9); um mulher misturando fermento numa massa (Mateus 13.33); um caçador de tesouros (Mateus 13.44); um negociante de pérolas (Mateus 13.45-46); alguns pescadores (Mateus 13.47-50) e o dono de uma casa (Mateus 13.52). Em sua maioria, não são histórias que tratam do trabalho que mencionam. Jesus não nos diz como semear adequadamente um campo, como assar um pão ou como investir em commodities. Em vez disso, Jesus usa objetos materiais e trabalho humano como elementos de histórias que nos dão insights sobre o Reino de Deus. Nosso trabalho é capaz de produzir significado, mesmo na ilustração de realidades eternas. Isso nos lembra que nós e o mundo ao nosso redor brotamos da criação de Deus e continuamos sendo parte do Reino de Deus.

Pagamento de impostos (Mateus 17.24-27 e 22.15-22)

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Nos dias de Jesus, os judeus pagavam impostos tanto localmente, ao templo judaico, quanto ao governo pagão, de Roma. Mateus registra dois casos distintos que descrevem a visão de Jesus sobre o pagamento desses impostos. O primeiro incidente é registrado em Mateus 17.24-27, quando os coletores do imposto do templo perguntam a Pedro se Jesus pagava esse tributo. Ciente dessa conversa, Jesus indaga a Pedro: “O que você acha, Simão? De quem os reis da terra cobram tributos e impostos: de seus próprios filhos ou dos outros?”. Pedro responde: “Dos outros”. Jesus então lhe diz: “Então os filhos estão isentos. Mas para não escandalizá-los, vá ao mar e jogue o anzol. Tire o primeiro peixe que você pegar, abra-lhe a boca, e você encontrará uma moeda de quatro dracmas. Pegue-a e entregue-a a eles, para pagar o meu imposto e o seu”.

O segundo incidente, envolvendo o imposto romano, está registrado em Mateus 22.15-22. Aqui, fariseus e herodianos querem enganar Jesus fazendo-lhe a seguinte pergunta: “É certo pagar imposto a César ou não?”. Jesus percebe a malícia no coração deles e responde com uma pergunta penetrante: “Hipócritas! Por que vocês estão me pondo à prova? Mostrem-me a moeda usada para pagar o imposto”. Quando lhe entregam um denário, ele pergunta: “De quem é esta imagem e esta inscrição?”. Eles respondem: “De César”. Jesus, então, põe fim à conversa com estas palavras: “Então, deem a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.

Nossa verdadeira cidadania é a do reino de Deus, a cujos propósitos dedicamos nossos recursos. No entanto, entregamos aos poderes terrenos o que é devido. O pagamento de impostos é uma das obrigações fundamentais que nós, cidadãos ou residentes, assumimos pelos serviços que desfrutamos em qualquer sociedade civilizada. Esses serviços incluem o trabalho dos que prestam socorro (polícia, bombeiros, médicos e assim por diante), bem como as estruturas sociais em vigor que garantem justiça ou ajudam pobres, idosos e outros necessitados. O governo do Império Romano não tinha como foco principal o benefício do povo, mas, mesmo assim, fornecia estradas, água, policiamento e, às vezes, ajuda aos pobres. Talvez nem sempre concordemos quanto ao tipo ou à extensão dos serviços que nosso governo deve fornecer, mas sabemos que os impostos são essenciais para garantir nossa proteção pessoal e a ajuda àqueles que não podem se manter sozinhos.

Embora nem todas as atividades governamentais sirvam aos propósitos de Deus, Jesus não pede que desrespeitemos as exigências fiscais das nações onde residimos (Rm 13.1-10; 1Ts 4.11-12). Jesus está dizendo, em essência, que não precisamos necessariamente resistir ao pagamento de impostos por uma questão de princípio. A todo momento devemos fazer “todo o possível para viver em paz com todos” (Rm 12.18; Hb 12.14; cf. 1Pe 2.12), ao mesmo tempo em que também devemos viver como luzes que brilham nas trevas (Mt 5.13-16; Fp 2.15). Termos emprego e nos recusarmos a pagar os impostos, uma atitude que desonra o reino de Deus, não seria pacificador nem simpático.

Isso tem relação direta com o trabalho. Os ambientes de trabalho estão sujeitos às leis e aos poderes governamentais, além de aos impostos. Alguns governos têm leis e práticas que podem violar a ética e os propósitos cristãos, como era o caso de Roma no primeiro século. Governos ou seus funcionários podem exigir subornos, impor regras e regulamentos antiéticos, sujeitar pessoas a sofrimento e injustiça, e usar os impostos para fins contrários à vontade de Deus. Como acontece com os impostos, Jesus não exige que resistamos a cada um desses abusos. Somos como espiões ou guerrilheiros em território inimigo. Não podemos ficar atolados, lutando contra o reino inimigo em todas as frentes. Em vez disso, devemos agir estrategicamente, sempre perguntando o que mais promoverá o estabelecimento do reino de Deus na terra. É claro que nunca devemos nos envolver em práticas abusivas para benefício próprio. (Esse tópico também é discutido em Questões com impostos (Lucas 19.1-10; 20.20-26) em Lucas e o trabalho em www.teologiadotrabalho.org.)