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Atos e o trabalho

Comentário Bíblico / Produzido por Projeto Teologia do Trabalho
Acts

Introdução a Atos

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O livro de Atos, também conhecido como Atos dos Apóstolos, retrata a igreja primitiva trabalhando arduamente para crescer e servir aos outros diante de oposição, escassez de pessoas e de dinheiro, hierarquia governamental (a hierarquia da igreja surgiria mais tarde), conflitos internos e até mesmo forças da natureza. Seu trabalho apresenta semelhanças com o que os cristãos enfrentam hoje em locais de trabalho não relacionados à igreja. Um pequeno grupo coloca todo seu coração no trabalho que leva o amor de Cristo às pessoas em todas as esferas da vida, e seus membros descobrem o incrível poder do Espírito Santo trabalhando neles enquanto agem. Se não estamos experimentando isso no trabalho diário, talvez Deus queira guiar, conceder dons e capacitar nosso trabalho como fez com o deles.

O trabalho ocupa posição de destaque no livro, como seria de esperar em uma obra que fala sobre os “atos” dos líderes da igreja primitiva. A narrativa está repleta de pessoas caminhando, falando, curando, ofertando com generosidade, tomando decisões, governando, servindo comida, administrando dinheiro, lutando, fabricando roupas, tendas e outros bens, batizando (ou lavando), debatendo, discutindo, fazendo julgamentos, lendo e escrevendo, cantando, defendendo-se no tribunal, recolhendo lenha, fazendo fogueiras, escapando de multidões hostis, abraçando e beijando, participando de conselhos, pedindo desculpas, navegando, abandonando navios, nadando, resgatando pessoas e, em meio a tudo isso, louvando a Deus. Os homens e as mulheres do livro de Atos estão prontos para fazer o que for preciso para cumprir sua missão. Nenhum trabalho é servil demais para os mais importantes entre eles, e nenhum trabalho é excessivamente assustador para os mais humildes.

No entanto, a profundidade do livro de Atos decorre não tanto do que as pessoas da igreja primitiva fazem, mas do porquê e de como elas se envolvem nessa incrível explosão de atividade. O porquê é o serviço. Servir a Deus, servir aos colegas, servir à sociedade, servir a estranhos — o serviço é a motivação por trás do trabalho que os cristãos realizam ao longo do livro. Isso não deve ser surpresa, porque Atos é, de fato, o segundo volume da história iniciada no Evangelho de Lucas, e o serviço também é a motivação que impulsiona Jesus e seus seguidores, em Lucas. (Veja Lucas e o trabalho em www.teologiadotrabalho.org para obter informações básicas essenciais sobre Lucas e seu público.)

Se o porquê é o serviço, então o como é desafiar constantemente as estruturas da sociedade romana, que não se baseava no serviço, e sim na exploração. Lucas contrasta continuamente os caminhos do reino de Deus com os do Império Romano. Sua atenção se volta para as muitas interações de Jesus e de seus seguidores com os oficiais do império. Possui grande consciência dos sistemas de poder — e dos fatores socioeconômicos que os sustentam — em operação no Império Romano. Partindo do imperador e descendo para os nobres, os oficiais, os proprietários de terras, os homens livres, os servos e os escravos, cada camada da sociedade existia com base no exercício de poder sobre a camada logo abaixo. O caminho de Deus, como visto no Evangelho de Lucas e no livro de Atos, é exatamente o oposto. A sociedade de Deus existe para servir, e em especial para servir aqueles em posições mais fracas, os mais pobres e os mais vulneráveis.

Em última análise, portanto, Atos não é um modelo dos tipos de atividades em que devemos nos envolver como seguidores de Cristo, mas um modelo do compromisso com o serviço que deve formar a base de nossas ações. Nossas atividades são diferentes das dos apóstolos, mas nosso compromisso com o serviço é o mesmo.

Comunidade missional (Atos 1.6)

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No livro de Atos, a missão de Jesus, a de restaurar o mundo como Deus pretendia que fosse, é transformada na missão da comunidade dos seguidores de Jesus. Atos apresenta a vida da comunidade dos seguidores de Jesus à medida que o Espírito os transforma em um grupo de pessoas que trabalha e usa o poder e a riqueza relacionados ao trabalho de maneira diferente da do mundo ao seu redor. O trabalho tem início com a criação de uma comunidade singular chamada igreja. Lucas começa com os membros da comunidade “reunidos” e prossegue com a missão de “restaurar o reino a Israel” (At 1.6). Para realizar esse trabalho, a comunidade deve primeiro se voltar para sua vocação para o reino de Deus e, depois, para sua identidade como testemunha do reino de Deus na vida cotidiana.

Uma vocação orientadora para o reino de Deus (Atos 1.8)

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O livro de Atos começa com uma interação pós-ressurreição entre Jesus e seus discípulos. Jesus ensina seus discípulos sobre o “Reino de Deus” (At 1.3). Eles respondem com uma pergunta sobre o estabelecimento de um reino sociopolítico: “Senhor, é neste tempo que vais restaurar o reino a Israel?” (At 1.6). [1] A resposta de Jesus tem uma relação profunda com nossa vida como trabalhadores.

“Não compete a vocês saber os tempos ou as datas que o Pai estabeleceu pela sua própria autoridade. Mas receberão poder quando o Espírito Santo descer sobre vocês, e serão minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria, e até os confins da terra”. (Atos 1.7-8)

Primeiro, Jesus põe fim à curiosidade dos discípulos sobre a linha do tempo do plano de Deus. “Não compete a vocês saber os tempos ou as datas que o Pai estabeleceu pela sua própria autoridade” (At 1.7). Devemos viver à espera da plenitude do reino de Deus, mas não de uma maneira inquisidora sobre o momento preciso do retorno de Deus em Cristo. Segundo, Jesus não nega que Deus estabelecerá um reino sociopolítico, ou seja, que ele vai “restaurar o reino a Israel”, como a pergunta dos discípulos coloca.

Os discípulos de Jesus eram todos bem versados ​​nas Escrituras de Israel. Eles sabiam que o reino descrito pelos profetas não era uma realidade de outro mundo, mas sim um reino real de paz e justiça em um mundo renovado pelo poder de Deus. Jesus não nega a realidade desse reino vindouro, mas expande os limites da expectativa dos discípulos ao incluir toda a criação no reino esperado. Não é simplesmente um novo reino para o território de Israel, mas “em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria, e até os confins da terra” (At 1.8).

A realização desse reino ainda não está aqui (“neste tempo”), mas está aqui, neste mundo.

Vi a Cidade Santa, a nova Jerusalém, que descia dos céus, da parte de Deus [...]. Ouvi uma forte voz que vinha do trono e dizia: “Agora o tabernáculo de Deus está com os homens...”. (Apocalipse 21.2-3)

O reino dos céus vem à terra, e Deus habita aqui, no mundo redimido. Por que ainda não está aqui? O ensino de Jesus sugere que parte da resposta é porque seus discípulos têm trabalho a fazer. O trabalho humano foi necessário para completar a criação de Deus, mesmo no jardim do Éden (Gn 2.5), mas nosso trabalho foi prejudicado pela Queda. Em Atos 1 e 2, Deus envia seu Espírito para capacitar o trabalho humano. “Receberão poder quando o Espírito Santo descer sobre vocês, e serão minhas testemunhas” (At 1.8a). Jesus está dando a seus seguidores uma vocação — testemunhar, no sentido de tornar manifesto o poder do Espírito em todas as esferas da atividade humana — que é essencial para a vinda do reino. O dom divino do Espírito Santo preenche a lacuna entre o papel essencial que Deus atribuiu ao trabalho humano e nossa capacidade de cumprir esse papel. Pela primeira vez desde a Queda, nosso trabalho tem o poder de contribuir para a realização do reino de Deus na volta de Cristo. A grande maioria dos estudiosos entende Atos 1.8 como a declaração programática deste segundo volume dos dois escritos por Lucas.

De fato, todo o livro de Atos pode ser considerado uma expressão (às vezes vacilante) da vocação cristã de dar testemunho do Jesus ressuscitado. Mas dar testemunho significa muito mais que evangelizar. Não devemos cair no erro de pensar que Jesus está falando apenas sobre o trabalho do indivíduo de compartilhar com as próprias palavras o evangelho com um incrédulo. Em vez disso, dar testemunho do reino vindouro significa principalmente viver agora de acordo com os princípios e as práticas do reino de Deus. Veremos que a forma mais eficaz de testemunho cristão é, muitas vezes — talvez principalmente —, compartilhar da vida da comunidade à medida que ela realiza seu trabalho.

A vocação cristã compartilhada de testemunho só é possível por meio do poder do Espírito Santo. O Espírito transforma indivíduos e comunidades de maneiras que resultam no compartilhamento dos frutos do trabalho humano — especialmente poder, recursos e influência — com a comunidade e a cultura ao redor. A comunidade testemunha quando os fortes ajudam os fracos. A comunidade testemunha quando seus membros usam seus recursos para beneficiar a cultura em geral. A comunidade testemunha quando aqueles ao redor veem que trabalhar nos caminhos da justiça, da bondade e da beleza leva a uma vida mais plena.

Os locais mencionados por Jesus revelam que o testemunho dos discípulos os coloca em perigo social. Ao grupo de discípulos judeus de Jesus é ordenado que falem em nome de um homem que havia pouco tempo fora crucificado como inimigo do Império Romano e blasfemador do Deus de Israel. Eles são chamados a assumir essa vocação na cidade em que seu mestre foi morto, entre os samaritanos — inimigos históricos e étnicos dos judeus — e nos rincões do Império Romano. [2]

Em resumo, Atos começa com uma vocação orientadora que chama os seguidores de Jesus para a tarefa fundamental do testemunho. Testemunhar significa, acima de tudo, viver de acordo com os caminhos do reino vindouro de Deus. Como veremos em breve, o elemento mais importante desta vida é que trabalhamos principalmente para o bem dos outros. Essa vocação se torna possível pelo poder do Espírito Santo e deve ser exercida sem preocupação excessiva com as barreiras sociais. Essa vocação orientadora não menospreza o valor do trabalho humano ou da vida profissional dos discípulos de Jesus em favor apenas da proclamação verbal do evangelho. Bem ao contrário, Atos argumentará vigorosamente que todo trabalho humano pode ser uma expressão fundamental do reino de Deus.

Uma identidade cristã como testemunha do reino de Deus na vida cotidiana (Atos 2.1-41)

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Não há dúvida de que o evento do Pentecoste é central para a vida da comunidade cristã primitiva. É o evento que inicia a vocação de testemunho descrita em Atos 1.8. Esta seção de Atos traz dois tipos de reivindicação a todos os trabalhadores. Primeiro, o relato do Pentecoste identifica seus ouvintes cristãos dentro de uma nova comunidade que traz à vida a recriação do mundo — isto é, o reino de Deus — prometido por Deus por meio dos profetas. Pedro explica o fenômeno ocorrido no Pentecoste referindo-se ao profeta Joel.

Estes homens não estão bêbados, como vocês supõem. Ainda são nove horas da manhã! Ao contrário, isto é o que foi predito pelo profeta Joel: “Nos últimos dias, diz Deus, derramarei do meu Espírito sobre todos os povos. Os seus filhos e as suas filhas profetizarão, os jovens terão visões, os velhos terão sonhos. Sobre os meus servos e as minhas servas derramarei do meu Espírito naqueles dias, e eles profetizarão. Mostrarei maravilhas em cima, no céu, e sinais em baixo, na terra: sangue, fogo e nuvens de fumaça. O sol se tornará em trevas e a lua em sangue, antes que venha o grande e glorioso dia do Senhor. E todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo!” (Atos 2.15-21)

Pedro se refere a uma seção de Joel que descreve a restauração do povo de Deus exilado para afirmar que Deus iniciou a libertação definitiva de seu povo. [3] O retorno do povo de Deus à terra cumpre tanto as promessas da aliança de Deus quanto inicia a recriação do mundo. Joel descreve essa recriação com imagens de tirar o fôlego. À medida que o povo de Deus volta à terra, o deserto ganha vida como uma espécie de novo Éden. Terra, animais e pessoas se regozijam com a vitória de Deus e a libertação de seu povo (ver Jl 2). Entre as ricas imagens dessa seção de Joel, lemos que a restauração do povo de Deus levará a um impacto econômico imediato. “O Senhor respondeu ao seu povo:

‘Estou enviando para vocês trigo, vinho novo e azeite, o bastante para satisfazê-los plenamente; nunca mais farei de vocês objeto de zombaria para as nações’” (Jl 2.19). Para Joel, o clímax desse ato de libertação é o derramamento do Espírito sobre o povo de Deus. Pedro entende que a vinda do Espírito significa que os primeiros seguidores de Jesus são — de alguma maneira real, ainda que profundamente misteriosa — participantes do novo mundo de Deus.

Um segundo ponto importante e intimamente relacionado ao primeiro é que Pedro descreve a salvação como o resgate de uma “geração corrompida” (At 2.40). Duas coisas precisam de esclarecimento. Primeiro, Lucas não descreve a salvação como uma fuga deste mundo para uma existência celestial. Em vez disso, a salvação começa bem no meio deste mundo atual. Segundo, Lucas espera que a salvação tenha um componente de tempo presente. Começa agora, como um modo de vida diferente, contrário aos padrões dessa “geração corrompida”. Uma vez que o trabalho e suas consequências econômicas e sociais são tão centrais para a identidade humana, não é de surpreender que um dos primeiros padrões da vida humana a ser reconstituído seja como os cristãos administram seu poder e suas posses. Assim, o fluxo desta seção inicial de Atos se desenvolve do seguinte modo: (1) Jesus sugere que toda a vida humana deve dar testemunho de Cristo; (2) a vinda do Espírito marca o início do “dia do Senhor” há muito prometido e introduz as pessoas no novo mundo de Deus; e (3) as expectativas do “dia do Senhor” incluem profundas transformações econômicas. O próximo passo de Lucas é apontar para um novo povo, capacitado pelo Espírito e que vive de acordo com a economia do reino.

Uma comunidade orientadora que pratica os caminhos do reino de Deus: Atos 2.42—4.32

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Depois de Pedro anunciar que o Espírito criou um novo tipo de comunidade, Atos relata o rápido crescimento delas em vários lugares. Os resumos das características dessa comunidade em Atos 2.42-47 e 4.32-38 são descrições bastante específicas. De fato, os próprios textos são notáveis ​​ao descrever o escopo do compromisso e da vida compartilhada dos primeiros crentes. [1] Como os resumos têm muitas semelhanças, vamos discuti-los em conjunto.

Eles se dedicavam ao ensino dos apóstolos e à comunhão, ao partir do pão e às orações. Todos estavam cheios de temor, e muitas maravilhas e sinais eram feitos pelos apóstolos. Os que criam mantinham-se unidos e tinham tudo em comum. Vendendo suas propriedades e bens, distribuíam a cada um conforme a sua necessidade. Todos os dias, continuavam a reunir-se no pátio do templo. Partiam o pão em casa e juntos participavam das refeições, com alegria e sinceridade de coração, louvando a Deus e tendo a simpatia de todo o povo. E o Senhor lhes acrescentava diariamente os que iam sendo salvos. (Atos 2.42-47)
Da multidão dos que creram, uma era a mente e um o coração. Ninguém considerava unicamente sua coisa alguma que possuísse, mas compartilhavam tudo o que tinham. Com grande poder os apóstolos continuavam a testemunhar da ressurreição do Senhor Jesus, e grandiosa graça estava sobre todos eles. Não havia pessoas necessitadas entre eles, pois os que possuíam terras ou casas as vendiam, traziam o dinheiro da venda e o colocavam aos pés dos apóstolos, que o distribuíam segundo a necessidade de cada um. José, um levita de Chipre a quem os apóstolos deram o nome de Barnabé, que significa “encorajador”, vendeu um campo que possuía, trouxe o dinheiro e o colocou aos pés dos apóstolos. (Atos 4.32-37)

Embora não descrevam o trabalho diretamente, esses textos preocupam-se profundamente com a distribuição de poder e de posses, duas realidades que muitas vezes resultam do trabalho humano. A primeira coisa a notar, comparativamente com a sociedade ao redor, é que as comunidades cristãs cultivam um conjunto muito diferente de práticas em relação ao uso do poder e das posses. Está claro que os primeiros cristãos compreendiam que o poder e as posses do indivíduo não deveriam ser guardados para conforto próprio, mas serem gastos ou sabiamente investidos para o bem da comunidade cristã. Dito de forma sucinta, os bens são para o bem de outros. Mais do que qualquer coisa, a vida no reino de Deus significa trabalhar para o bem dos outros.

Duas afirmações precisam ser feitas aqui. Primeiro, esses textos nos pedem que compreendamos nossa identidade principalmente como membros da comunidade cristã. O bem da comunidade é o bem de cada membro, individualmente. Em segundo lugar, trata-se de um afastamento radical da economia clientelista que marcou o Império Romano. Em um sistema de clientelismo, os benefícios dados pelos ricos aos pobres criam uma estrutura de obrigação sistemática. Cada presente de um benfeitor implica uma dívida social assumida pelo beneficiário. Esse sistema criou uma espécie de pseudogenerosidade na qual patrícios generosos muitas vezes doavam por interesse próprio, buscando acumular honras ligadas ao clientelismo. [2] Em essência, a economia romana via a “generosidade” como um caminho para o poder e o status social. Essas noções de obrigação recíproca sistemática estão completamente ausentes nas descrições apresentadas em Atos 2 e 4. Na comunidade cristã, a doação deve ser motivada por uma preocupação genuína com a prosperidade do beneficiário, não com a honra do benfeitor. Dar tem pouco a ver com quem doa e tudo a ver com quem recebe.

É um sistema socioeconômico completamente diferente. Tal como o Evangelho de Lucas, Atos demonstra regularmente que a conversão cristã resulta na reorientação de abordagem das posses e do poder. Além disso, essa insistência de que os bens devem ser usados ​​em benefício do próximo é modelada explicitamente a partir da vida e da missão de Jesus e, de modo especial, por meio de sua morte abnegada. (Veja Lucas e o trabalho em www.teologiadotrabalho.org.)

A economia da generosidade radical (Atos 2.45; 4.34-35)

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Estamos diante de um debate contínuo sobre se esses resumos comunitários defendem ou não um determinado sistema econômico, com alguns comentaristas descrevendo a prática da comunidade como “protocomunismo” e outros enxergando uma alienação obrigatória de bens. O texto, no entanto, não sugere uma tentativa de mudar as estruturas além da comunidade cristã. De fato, seria difícil pensar em um grupo pequeno, marginalizado e socialmente impotente com planos de mudar o sistema econômico imperial. Está claro que a comunidade não se afastou completamente dos sistemas econômicos do império. Provavelmente, os pescadores permaneceram membros de cooperativas de pesca e os artesãos continuaram a fazer negócios no mercado. [1] Paulo, afinal, continuou fazendo tendas para apoiar suas viagens missionárias (At 18.3).

Em vez disso, o texto sugere algo muito mais exigente. Na igreja primitiva, pessoas de posses e poder vendiam suas propriedades em favor dos mais necessitados “conforme a sua necessidade” (At 2.45 ; 4.34,35). Isso descreve um tipo de disponibilidade radical em relação à situação das posses individuais. Ou seja, os recursos — materiais, políticos, sociais ou práticos — de qualquer membro da comunidade eram constantemente colocados à disposição da comunidade cristã, ao mesmo tempo em que membros individuais continuavam a supervisionar seus recursos específicos. Em vez de prescrever sistematicamente a distribuição da riqueza de forma a garantir igualdade absoluta, a igreja primitiva aceitou a realidade do desequilíbrio econômico, mas praticou a generosidade radical, ou seja, os bens existiam verdadeiramente para o benefício do todo, não do indivíduo. Essa forma de generosidade é, em muitos aspectos, mais desafiadora do que um sistema rígido de regras. Ela exige responsividade contínua, envolvimento mútuo na vida dos membros da comunidade e a disposição contínua de desapego das posses, valorizando mais os relacionamentos dentro da comunidade do que a (falsa) segurança das posses. [2]

É altamente provável que esse sistema dentro de um sistema tenha sido inspirado pelos ideais econômicos expressos na lei de Israel, culminando com a prática do Jubileu — a redistribuição de terras e riquezas dentro de Israel, uma vez a cada cinquenta anos (Lv 25.1-55). O Jubileu foi planejado por Deus para garantir que todas as pessoas tivessem acesso aos meios de subsistência, um ideal que parece nunca ter sido amplamente praticado pelo povo de Deus. Jesus, no entanto, apresenta seu ministério fazendo uso de um conjunto de textos de Isaías 61 e 58 que reproduzem muitos temas do Jubileu:

“O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me ungiu para pregar boas-novas aos pobres. Ele me enviou para proclamar liberdade aos presos e recuperação da vista aos cegos, para libertar os oprimidos e proclamar o ano da graça do Senhor.” (Lc 4.18-19)

É possível perceber uma alusão à ética do Jubileu em Atos 4.34, onde Lucas nos diz que “não havia pessoas necessitadas entre eles”. Isso parece ser um eco direto de Deuteronômio 15.4, onde se vê que a prática do ano sabático (um minijubileu que ocorre a cada sete anos) foi projetada para garantir que não houvesse “pobre algum” no meio do povo.

É apropriado que a comunidade cristã veja isso como um modelo para sua vida econômica. Porém, enquanto no antigo Israel o ano sabático e o Jubileu eram praticados apenas a cada sete e a cada cinquenta anos, respectivamente, a disponibilidade radical marcou o uso dos recursos da comunidade cristã primitiva. Podemos imaginá-la em termos semelhantes aos do Sermão do Monte: “Vocês ouviram o que foi dito antigamente: 'Devolva sua terra aos que nada têm uma vez a cada cinquenta anos', mas eu lhes digo: 'Torne seu poder e seus recursos disponíveis sempre que perceber uma necessidade'”. A generosidade radical, baseada nas necessidades dos outros, torna-se o fundamento da prática econômica na comunidade cristã. Analisaremos isso em profundidade através dos acontecimentos narrados no livro de Atos.

As práticas das primeiras igrejas cristãs desafiam os cristãos contemporâneos a pensarem de maneira imaginativa sobre modelos de generosidade radical para hoje. Como a disponibilidade radical poderia servir de testemunho do reino de Deus e produzir uma forma alternativa plausível de estruturar a vida humana em uma cultura marcada pela busca obstinada de riqueza e segurança pessoais?

O Espírito Santo capacita a generosidade radical com todo tipo de recurso (At 2.42-47; 4.32-38)

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É importante destacar dois pontos derradeiros a serem observados com relação ao uso de recursos na comunidade cristã primitiva. O primeiro é a necessidade do Espírito Santo para a prática da generosidade radical. As descrições da comunidade em Atos 2.42-47 e 4.32-38 surgem imediatamente após as duas primeiras grandes manifestações do Espírito Santo. Lucas não poderia ser mais claro ao estabelecer um vínculo entre a presença e o poder do Espírito, e a capacidade da comunidade de viver com a generosidade cristã. Devemos entender que uma das obras fundamentais do Espírito na vida dos primeiros cristãos foi o cultivo de uma comunidade que assumiu uma postura radicalmente diferente no que se refere à distribuição de recursos. Portanto, embora muitas vezes sejamos pegos pela procura por manifestações mais espetaculares do Espírito (visões, línguas etc.), precisamos considerar o fato de que o simples ato de compartilhar e a hospitalidade consistente podem ser alguns dos mais extraordinários dons do Espírito Santo.

Em segundo lugar, para que não comecemos a pensar que essa palavra é apenas para aqueles que dispõem de recursos financeiros, vemos Pedro e João demonstrar que todos os recursos devem ser usados em benefício dos outros. Em Atos 3.1-10, Pedro e João encontram um aleijado pedindo esmola junto à porta do templo, Embora Pedro e João não tenham dinheiro algum, possuem um testemunho da chegada do reino por meio da vida, morte e ressurreição de Jesus. Por isso, Pedro responde: “Não tenho prata nem ouro, mas o que tenho, isto lhe dou. Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, ande” (At 3.6). Vemos aqui um exemplo de compartilhamento de recursos não relacionado com a riqueza monetária. O uso de poder e posição para edificar a comunidade ocorrerá em várias outras ocasiões em Atos.

Talvez a expressão mais comovente ocorra quando Barnabé — que, em Atos 4.32-38, é um exemplo de generosidade radical de recursos financeiros — também coloca seus recursos sociais à disposição de Paulo, ajudando-o a ser recebido na relutante comunidade dos apóstolos em Jerusalém (ver At 9.1-31). Outro exemplo é Lídia, que faz uso de sua alta posição social na indústria têxtil, em Tiatira, como porta de entrada para Paulo naquela cidade (At 16.11-15). O capital social deve ser empregado, como qualquer outro, para o bem do reino, conforme entendido pela comunidade cristã.

Uma comunidade justa é uma testemunha para o mundo (At 2.47; 6.7)

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Quando os recursos são adequadamente empregados na vida da comunidade cristã — como acontece após a escolha dos que ajudariam na distribuição de alimentos em Atos 6 —, a comunidade se torna um ímã. A vida de justiça da comunidade, marcada principalmente pelo uso altruísta do poder e das posses, atrai as pessoas a ela e a seu líder, Jesus. Quando a comunidade usa suas posses e privilégios para dar vida aos necessitados, quando os recursos do indivíduo estão totalmente comprometidos em beneficiar outros na comunidade, as pessoas acorrem para participar. Já vimos que “o Senhor lhes acrescentava diariamente os que iam sendo salvos” (At 2.47). Isso também fica evidente nos resultados do serviço capacitado pelo Espírito, em Atos 6. O trabalho dos sete diáconos, de formação de comunidade e promoção da justiça, resulta em vida para muitos. “Assim, a palavra de Deus se espalhava. Crescia rapidamente o número de discípulos em Jerusalém; também um grande número de sacerdotes obedecia à fé.” (At 6.7)

Um confronto de reinos: comunidade e poder (At 5—7)

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Atos acontece na realidade terrena de uma comunidade genuína, e não encobre a ameaça que os efeitos do pecado representam para as comunidades. As duas primeiras grandes ameaças à comunidade cristã que Lucas apresenta são questões relacionadas a recursos. Como veremos, Ananias e Safira, bem como o setor de língua hebraica/aramaica da comunidade, caem em pecado em relação à administração de recursos e poder. Para Lucas, essa deficiência ameaça a própria vida da comunidade.

Ananias e Safira: um caso de identidade de má índole (At 5.1-11)

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A morte de Ananias e Safira (At 5.1-11) é completamente assustadora e intrigante. Os dois, um casal, vendem uma propriedade e doam publicamente os lucros para a comunidade. No entanto, retêm secretamente uma parte do dinheiro para si mesmos. Pedro detecta a fraude e confronta os dois separadamente. O simples fato de ouvir a acusação de Pedro faz que cada um deles caia morto no local. Para nós, seu destino parece desproporcional a sua infração. Pedro reconhece que eles não tinham obrigação de doar o dinheiro: “Ela não pertencia a você? E, depois de vendida, o dinheiro não estava em seu poder?” (At 5.4). A propriedade privada não foi abolida, e mesmo aqueles que fazem parte da comunidade de amor ao próximo podem legitimamente optar por manter para si os recursos que Deus lhes confiou. Então, por que a mentira sobre o dinheiro traz morte instantânea?

Muitas tentativas foram feitas para descrever o motivo da morte deles e até mesmo de nomear o pecado que cometeram. [1] Em essência, parece que a transgressão de Ananias e Safira é o fato de serem falsos membros da comunidade. Como diz o estudioso Scott Bartchy: “Ao mentir para alcançar uma honra que não conquistaram, Ananias e Safira não apenas se desonraram e se envergonharam como patrícios, mas também se revelaram forasteiros, alheios”. [2] Eles são mais impostores do que avarentos. [3]

Enquanto fingem ter se tornado membros do sistema cristão de amor ao próximo, sua falsidade demonstra que eles ainda agem como membros do sistema de clientelismo romano. Eles tentam se parecer com Barnabé em sua abordagem altruísta de administração de recursos (At 4.36-37). Mas a motivação do casal é, na verdade, ganhar honra para si mesmos de forma medíocre. Ao fazê-lo, eles realmente agem como parte da economia patronal romana. Aparentam generosidade, mas doam em busca de status, e não por amor. Além disso, sua mentira sobre a forma de administrar recursos é interpretada por Pedro como uma mentira ao Espírito Santo e a Deus (At 5.3-4). Como é impressionante o fato de uma mentira à comunidade ser equiparada a uma mentira ao Espírito de Deus! E uma mentira sobre recursos é tão séria quanto uma mentira sobre questões “religiosas”. Já vimos que um dos papéis principais do Espírito Santo é transformar o povo de Deus em uma comunidade que usa os recursos tendo como base uma profunda preocupação pelos outros. Não é de surpreender, então, que o falso ato de generosidade de Ananias e Safira seja descrito como uma falsificação da obra do Espírito. Sua falsa generosidade e sua tentativa de enganar o Espírito Santo são uma ameaça à identidade da comunidade cristã. Esse é um claro lembrete sobre os sérios riscos associados à comunidade cristã e a nossa própria participação nela.

A fraude de Ananias e Safira ocorre no âmbito monetário. E se isso ocorresse no próprio campo do trabalho? E se eles tivessem fingido servir a seus senhores como se estivessem servindo a Deus (Cl 3.22-24), ou tratar seus subordinados com justiça (Cl 3.25) ou se envolver em conflitos honestamente (Mt 18.15-17)? Enganar a comunidade cristã sobre essas coisas teria causado uma ameaça igualmente inaceitável para a comunidade? Lucas não relata nenhum caso como esses em Atos, mas o mesmo princípio se aplica. Pertencer genuinamente à comunidade cristã traz consigo uma mudança fundamental de orientação. Agora agimos em todos os aspectos — inclusive no trabalho — visando amar o próximo como a nós mesmos, não aumentar fatores pessoais como status social, riqueza e poder.

O Espírito e o obreiro (At 6.1-7)

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Temas do relato de Ananias e Safira estão presentes em Atos 6.1-7, e marca a primeira disputa interna da comunidade cristã. Os judeus de fala grega (“helenistas” ou “gregos” em outras versões) provavelmente retornaram a Jerusalém vindos de uma das muitas comunidades da diáspora do Império Romano. Os judeus de fala hebraica (ou “hebreus”) são provavelmente judeus da terra histórica de Israel (Palestina) que falam principalmente aramaico e/ou hebraico. Não é preciso muita imaginação social para entender o que está acontecendo nessa situação. Em uma comunidade que se vê como o cumprimento da aliança de Israel com Deus, os membros que se consideram israelitas típicos estão recebendo mais recursos do grupo do que os demais. Esse tipo de situação acontece regularmente em nosso mundo. Aqueles que mais se assemelham aos líderes de um movimento quanto à formação, cultura, ao status e assim por diante, muitas vezes se beneficiam de sua identidade em detrimento daqueles que de alguma forma são diferentes.

O Ministério da Palavra e o servir as mesas são igualmente valiosos (At 6.2-4)

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Uma das maiores contribuições de Atos à teologia do trabalho está na resposta dos apóstolos à injustiça intracomunitária de Atos 6.1-7. O trabalho de exercer justiça — neste caso, supervisionando a distribuição de alimentos — é tão importante quanto o trabalho de pregar a Palavra. Isso pode não ficar claro a princípio por causa de uma tradução de certo modo confusa na NVI e outras:

Não é certo negligenciarmos o ministério da palavra de Deus, a fim de servir às mesas. (At 6.2, NVI )

O termo “servir às mesas” (At 6.2) pode soar um pouco condescendente comparativamente com dedicar-se “ao ministério da palavra” (At 6.4). Os Doze estariam dizendo que cuidar da necessidade de alimento das pessoas é menos importante do que pregar a palavra? Uma maneira de interpretar essa passagem diz que servir às mesas é “trivialidade” [1] , uma “tarefa humilde” [2] ou uma das “tarefas inferiores” [3] na comunidade. Essa linha de interpretação vê a pregação subsequente de Estêvão como o propósito “real” por trás da influência do Espírito em Atos 6.3. [4] De acordo com essa visão, não haveria necessidade de o Espírito Santo se envolver na tarefa servil de gerenciar a alocação de recursos.

Mas isso reflete um viés na tradução que não é encontrado no grego original. Quando as traduções em português mencionam “servir às mesas” (At 6.2), em contraste com “ministério da palavra” (At 6.4), elas lançam mão de termos diferentes — “servir” e “ministrar” — para traduzir a mesma palavra grega, diakaneo, que é a original em Atos 6.2 e 6.4, e que significa “servir”. Portanto, uma tradução mais literal seria “servir às mesas” e “servir a palavra”. Ambos são diakaneo, serviço. Não há razão para usar uma palavra mais leve para servir às mesas.

Assim, o original grego dá a importante noção de que o trabalho de servir os necessitados está em pé de igualdade com o trabalho apostólico de oração e pregação. Os apóstolos servem a palavra, e os diáconos (como passaram a ser chamados) servem os necessitados. Seu serviço é qualitativamente o mesmo, embora as tarefas e habilidades específicas sejam diferentes. Ambos são essenciais para a formação do povo de Deus e para seu testemunho no mundo. A vida da comunidade depende dessas formas de serviço, e Lucas não nos passa a sensação de que uma é mais poderosa ou mais espiritual que a outra.

Apesar de tudo isso, seria possível argumentar que a condescendência em relação a servir às mesas é não apenas uma questão de tradução, mas sim algo realmente presente nas próprias palavras dos discípulos? Os próprios apóstolos poderiam ter imaginado que foram escolhidos para servir a palavra porque são mais talentosos do que aqueles que foram escolhidos para servir às mesas? É isso que eles querem dizer quando afirmam que não seria certo negligenciar o serviço da palavra para servir às mesas? Nesse caso, eles estariam voltando para algo semelhante ao sistema de clientelismo romano, colocando-se numa posição alta demais para se macularem ao servir às mesas. Eles estariam substituindo a antiga fonte de status romana (o clientelismo) por uma nova fonte de status (os dons do Espírito Santo). O evangelho de Deus vai mais fundo do que isso! Não há fonte de status na comunidade cristã. Um entendimento mais consistente seria que, se você é chamado a servir a palavra de Deus, não deve negligenciar o serviço à palavra para fazer outra coisa. Da mesma forma, se você é chamado para servir às mesas, não deve negligenciar o serviço às mesas para fazer outra coisa. As pessoas podem ser chamadas para tarefas diferentes, mas não há razão bíblica para considerar alguns chamados mais elevados do que outros.

Ironicamente, um dos que servem às mesas, Estêvão, acaba sendo ainda mais talentoso como pregador do que a maioria dos apóstolos (At 6.8—7.60). No entanto, apesar de seu dom de pregação, ele é designado para o serviço de distribuição de recursos. Naquele momento, pelo menos, era mais importante para os propósitos de Deus que ele atuasse como servidor junto às mesas do que como servidor da palavra. Para ele, nenhuma fome persistente de status o impede de aceitar esse chamado para servir às mesas.

Isso tem fortes ressonâncias no mundo de hoje. Com muita frequência, trabalhadores em ocupações de serviços de alimentação — o equivalente moderno de "servir às mesas" — encontram-se em empregos de status inferior, com remuneração inadequada, baixos benefícios, alta rotatividade e condições de trabalho difíceis ou até mesmo abusivas. Essa passagem do livro de Atos fala diretamente sobre essa situação. Aos olhos de Deus, o trabalho no setor de alimentação — ou em qualquer outro— não é insignificante ou degradante, mas uma forma de serviço semelhante à dos apóstolos. O que os cristãos podem fazer para transformar essa visão em realidade nos locais de trabalho, hoje?

A obra da liderança comunitária é uma obra do Espírito Santo (At 6.3)

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Os obreiros mais adequados para sanar a divisão étnica na comunidade de Atos 6 são qualificados porque são “cheios do Espírito e de sabedoria”. Como aqueles qualificados para a oração e a pregação, a habilidade dos que servem à mesa é resultado de poder espiritual. Nada menos do que o poder do Espírito possibilita a realização de um trabalho significativo, de construção de comunidade e de pacificação entre os cristãos. Essa passagem nos ajuda a ver que todo trabalho que edifica a comunidade — ou, mais amplamente, que promove justiça, bondade e beleza — é, em um sentido profundo, serviço (ou ministério) ao mundo.

Será que, em nossas igrejas, reconhecemos como iguais o ministério do pastor que prega a palavra, da mãe e do pai que provêm um lar amoroso para os filhos e do contador que faz uma declaração justa e honesta das despesas de seu empregador? Entendemos que todos eles dependem do Espírito para fazer seu trabalho pelo bem da comunidade? Pelo poder do Espírito, todo tipo de boa obra pode ser um meio de participação na renovação do mundo realizada por Deus.

Trabalho e identidade cristã (At 8—12)

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A próxima seção de Atos move a comunidade cristã, pelo poder do Espírito, através das barreiras culturais, à medida que o evangelho de Jesus Cristo é estendido a estrangeiros (samaritanos), párias sociais (o eunuco etíope), inimigos (Saulo) e todas as etnias (gentios). Esta seção tende a apresentar os personagens informando (grosso modo) sua ocupação. Aqui encontramos:

  • Simão, um feiticeiro (At 8.9-24)

  • Um eunuco etíope, um importante oficial da área econômica da rainha da Etiópia (At 8.27)

  • Saulo, o fariseu e perseguidor dos cristãos (At 9.1)

  • Tabita, uma costureira (At 9.36-43)

  • Cornélio, um centurião romano (At 10.1)

  • Simão, um curtidor (At 10.5)

  • Herodes, um rei (At 12)

Questões de trabalho não são a principal preocupação de Lucas nesta seção; portanto, devemos ter cuidado para não exagerar na citação de ocupações. O ponto de Lucas é que a maneira como eles exercem sua vocação indica se eles seguem na direção do reino ou se afastam dele.

Aqueles que se dirigem ao reino usam os frutos de seu trabalho para servir aos outros como testemunhas do reino de Deus. Aqueles que se afastam do reino usam os frutos de seu trabalho apenas para ganho pessoal. Isso fica evidente a partir de um breve resumo de alguns desses personagens. Vários deles buscam apenas ganho pessoal com seu trabalho, e com o poder e os recursos que o acompanham:

  • Simão oferece dinheiro aos apóstolos para que possa ter o poder de conceder o Espírito Santo (At 8.18-19) — um esforço claro para manter seu status social como “homem [que] é o poder divino conhecido como Grande Poder” (At 8.10).

  • Saulo usa sua rede de relacionamentos para perseguir os seguidores de Jesus (At 9.1-2), a fim de proteger o status social que ele desfrutava como judeu zeloso (At 22.3) e fariseu (At 26.5).

  • Herodes usa seu poder como rei-cliente de Roma para aumentar sua popularidade, matando o apóstolo Tiago (At 12.1-3). Mais tarde, Herodes se permite ser aclamado como um deus, o status de patronato final reivindicado pelos imperadores romanos (At 12.20-23).

As consequências desses atos são terríveis. Simão é fortemente repreendido por Pedro (At 8.20-23). Saulo é confrontado pelo Jesus ressuscitado, que se identifica com a própria comunidade que Saulo está perseguindo (At 9.3-9). Herodes é morto por um anjo do Senhor e comido por vermes (At 12.23). Em contraponto a eles estão várias pessoas que usam sua posição, poder ou recursos para abençoar e trazer vida:

  • Tabita, uma costureira, faz roupas para compartilhar com as viúvas de sua comunidade (At 9.39).

  • Simão, um curtidor de couro, abre sua casa para Pedro (At 10.5).

  • Cornélio, um centurião romano já conhecido por sua generosidade (At 10.4), usa suas conexões para convidar um grande número de amigos e familiares para ouvir a pregação de Pedro (At 10.24).

Embora tenha sido apresentado antes desta seção, Barnabé — que, por Atos 4.36, sabemos que é um levita — usa sua posição dentro da comunidade para inserir Saulo na comunidade apostólica, mesmo quando os apóstolos resistem (At 9.26-27), e para validar a conversão de gentios em Antioquia (At 11.22-24). Devemos observar que Atos 11.24 compartilha conosco o segredo da capacidade de Barnabé de usar seus recursos e sua posição de forma a edificar a comunidade de cristãos. Ali aprendemos explicitamente que Barnabé era “cheio do Espírito Santo”.

A mensagem em todos esses exemplos é consistente. O poder, o prestígio, a posição e os recursos advindos do trabalho devem ser usados em benefício dos outros — e não apenas em benefício próprio. Isso, novamente, é exemplificado por ninguém menos que o próprio Jesus, que, no Evangelho de Lucas, usa sua autoridade para o benefício do mundo, e não apenas para seu próprio bem.

Vemos em Atos 11.27-30 um exemplo comunitário do uso de recursos para o bem de outros que passam por necessidades. Em resposta a uma profecia inspirada pelo Espírito sobre uma fome por todo o mundo romano, “os discípulos, cada um segundo as suas possibilidades, decidiram providenciar ajuda para os irmãos que viviam na Judeia” (At 11.29). Vemos aqui o uso do fruto do trabalho humano em benefício de outros, que essa generosidade não era apenas espontânea e episódica, mas planejada, organizada e profundamente intencional. A coleta para a igreja em Jerusalém é discutida com mais detalhes na seção “1Coríntios 16.1-3” em 1Coríntios e o trabalho em www.teologiadotrabalho.org.

Em Atos 11.1-26 vemos o início de um relato a respeito de como a comunidade cristã resolveu uma séria disputa sobre se os gentios deveriam se converter ao judaísmo antes de se tornarem seguidores de Jesus. Essa disputa é discutida em um artigo no capítulo 15.

Choque de reinos: Comunidade e mercadores de poder (At 13—19)

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Exploraremos esta seção de acordo com quatro temas principais relevantes para a teologia do trabalho presente em Atos. Primeiro, examinaremos mais uma passagem relacionada à vocação como testemunho. Segundo, discutiremos como a comunidade cristã exerce o poder de liderança e de tomada de decisão. Terceiro, veremos como a comunidade liderada pelo Espírito se envolve com os poderes existentes na cultura mais ampla. Quarto, examinaremos se o fato de seguir a Cristo exclui certas formas de vocação e engajamento cívico. Por fim, exploraremos a prática do próprio Paulo de continuar trabalhando como fabricante de tendas em suas jornadas missionárias.

Vocação no contexto da comunidade (Atos 13.1-3)

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A passagem de Atos 13.1-3 nos traz um conjunto de práticas presentes na igreja de Antioquia. Essa comunidade é notável tanto por sua diversidade étnica quanto por seu compromisso com o testemunho prático do reino de Deus. [1] Já vimos como Lucas mostra que o trabalho — especialmente o uso de poder e recursos — funciona como uma forma de testemunho. [2] Vimos em Atos 6.1-7 que isso se aplica igualmente às vocações que associamos mais naturalmente ao ministério (como a missionária) e àquelas que mais provavelmente chamamos de “trabalho” (como a hospitalidade). Todas as vocações têm o potencial de servir e testemunhar do reino, especialmente quando empregadas na busca da justiça e da retidão.

Em Atos 13.1-3 vemos a comunidade cristã tentando discernir como o Espírito conduz os crentes ao testemunho. Paulo e Barnabé são escolhidos para trabalhar como evangelistas e promotores de cura itinerantes. O ponto de destaque é que esse discernimento se dá de forma comunitária. A comunidade cristã, e não o indivíduo, é mais capaz de discernir as vocações de seus membros individualmente. Isso pode significar que as comunidades cristãs de hoje devem atuar ao lado de famílias e jovens enquanto estes buscam respostas para perguntas como “o que você quer fazer quando crescer?”, “o que você fará depois da formatura?” ou “para o que Deus está chamando você?”. Isso exigiria que as comunidades cristãs desenvolvessem uma experiência muito maior em discernimento vocacional do que acontece atualmente. Também exigiria que houvesse um interesse muito mais sério no trabalho que serve ao mundo, além das estruturas da igreja. Apenas declarar autoridade sobre a vida profissional dos jovens não é suficiente. Os jovens só prestarão atenção se a comunidade cristã puder ajudá-los a realizar um trabalho de discernimento mais completo do que são capazes por outros meios.

Fazer isso de maneira adequada seria uma dupla forma de testemunho. Primeiro, jovens de todas as tradições religiosas — e de nenhuma — enfrentam enormes dificuldades para a tarefa de escolher ou encontrar trabalho. Imagine se a comunidade cristã pudesse de fato ajudar a reduzir esse fardo e melhorar os resultados. Segundo, a grande maioria dos cristãos trabalha fora das estruturas da igreja. Imagine se todos nos engajássemos em nosso trabalho como um meio de serviço cristão ao mundo, melhorando a vida de bilhões de pessoas com quem e para quem trabalhamos. Quão mais visível ao mundo Cristo se tornaria por meio disso?

O discernimento comunitário da vocação continua ao longo de Atos, com a convocação por parte de Paulo de muitos parceiros missionários da comunidade: Barnabé, Timóteo, Silas e Priscila, para citar apenas alguns. Em segundo lugar, testemunhando novamente do realismo de Lucas, vemos que essa vocação compartilhada para testemunhar não elimina a tensão relacional provocada pela pecaminosidade humana. Paulo e Barnabé têm um desentendimento tão sério sobre a inclusão de João Marcos (que havia abandonado a equipe em um compromisso anterior) que seguem caminhos distintos (At 15.36-40).

Liderança e tomada de decisões na comunidade cristã (At 15)

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Um exemplo da reorientação radical das interações sociais na comunidade cristã surge durante uma intensa discussão sobre se os cristãos gentios deveriam adotar leis e costumes judaicos. Na sociedade romana hierárquica, o patrício de uma organização social ditava a decisão a seus seguidores, talvez depois de ouvir várias opiniões. Na comunidade cristã, porém, as decisões importantes eram tomadas pelo grupo como um todo, confiando no igual acesso à orientação do Espírito Santo.

A discussão, na verdade, começa no capítulo 11. Pedro experimenta uma revelação surpreendente, segundo a qual Deus está oferecendo o “arrependimento para a vida” (At 11.18) aos gentios, sem exigir que eles primeiro se tornassem judeus. Porém, quando ele viaja para Jerusalém na companhia de alguns homens incircuncisos (gentios), alguns dos cristãos de lá reclamam que ele está violando a lei judaica (At 11.1-2). Quando desafiado dessa maneira, Pedro não fica com raiva, não tenta dominar os homens, lembrando-lhes sua posição de liderança entre os discípulos de Jesus, não menospreza a opinião deles nem contesta seus motivos. Em vez disso, ele conta a história dos acontecimentos para que chegasse a essa conclusão, e como vê a mão de Deus nisso: “Se, pois, Deus lhes deu o mesmo dom que nos tinha dado quando cremos no Senhor Jesus Cristo, quem era eu para pensar em opor-me a Deus?” (At 11.17). Observe que ele se retrata não como sábio nem moralmente superior, mas como alguém que estava à beira de cometer um erro grave até ser corrigido por Deus.

Então, ele deixa que seus desafiantes respondam. Tendo ouvido a experiência de Pedro, eles não reagem na defensiva, não desafiam a autoridade de Pedro em nome de Tiago (irmão do Senhor e líder da igreja de Jerusalém) nem o acusam de exceder sua autoridade. Em vez disso, também enxergam a ação da mão de Deus e chegam à mesma conclusão que Pedro. O que começou como um confronto termina em comunhão e louvor. “Ouvindo isso, não apresentaram mais objeções e louvaram a Deus” (At 11.18). Não podemos esperar que todos os desentendimentos sejam resolvidos de forma tão amigável, mas podemos compreender que, quando as pessoas reconhecem e observam a graça de Deus na vida umas das outras, há todos os motivos para esperar um resultado mutuamente edificante.

Pedro deixa Jerusalém em clima de concordância com seus antigos antagonistas, mas na Judeia permanecem outros que estão ensinando que os gentios devem primeiro se converter ao judaísmo. “Se vocês não forem circuncidados conforme o costume ensinado por Moisés, não poderão ser salvos” (At 15.1). Paulo e Barnabé estão em Antioquia nessa época e, assim como Pedro, experimentaram a graça de Deus aos gentios sem necessidade de conversão ao judaísmo. O texto nos diz que a divisão era séria, mas que foi tomada uma decisão conjunta de buscar a sabedoria da comunidade cristã como um todo. “Isso levou Paulo e Barnabé a uma grande contenda e discussão com eles. Assim, Paulo e Barnabé foram designados, com outros, para irem a Jerusalém tratar dessa questão com os apóstolos e com os presbíteros.” (At 15.2)

Eles chegam a Jerusalém e são recebidos calorosamente pelos apóstolos e presbíteros (At 15.4). Aqueles que mantêm a opinião contrária — que os gentios devem primeiro se converter ao judaísmo — também estão presentes (At 15.5). Todos decidem se reunir para considerar o assunto e se envolvem em um grande debate (At 15.7). Então Pedro, que, é claro, está entre os apóstolos em Jerusalém, repete a história de como Deus lhe revelou sua graça para os gentios, sem a exigência de se converterem ao judaísmo (At 15.8). Paulo e Barnabé relatam as experiências semelhantes que tiveram, também se concentrando no que Deus está fazendo, em vez de reivindicar qualquer sabedoria superior ou autoridade (At 15.12). Todos os oradores são ouvidos com respeito. Em seguida, o grupo considera o que cada um disse à luz das Escrituras (At 15.15-17). Tiago, que atua como chefe da igreja em Jerusalém, propõe uma resolução: “Julgo que não devemos pôr dificuldades aos gentios que estão se convertendo a Deus. Ao contrário, devemos escrever a eles, dizendo-lhes que se abstenham de comida contaminada pelos ídolos, da imoralidade sexual, da carne de animais estrangulados e do sangue” (At 15.19-20).

Se Tiago exercesse autoridade como um patrício romano, seria o fim da questão. Seu status, por si só, decidiria a questão. Mas não é assim que a decisão se desenrola na comunidade cristã. Ela aceita sua decisão, mas por concordância, e não imposição. Não apenas Tiago, mas todos os líderes — na verdade, toda a igreja — têm voz na decisão: “Os apóstolos e os presbíteros, com toda a igreja, decidiram…” (At 15.22). E, quando enviam uma mensagem às igrejas gentias sobre sua decisão de “não [lhes] impor [...] nada além das seguintes exigências necessárias” (At 15.28b), o fazem em nome de todo o corpo, não em nome de Tiago, como patrício: “Concordamos todos em escolher alguns homens e enviá-los a vocês” (At 15.25). Além disso, não reivindicam autoridade pessoal, mas afirmam apenas que tentaram ser obedientes ao Espírito Santo: “Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós...” (At 15.28a). A palavra pareceu indica humildade em sua decisão, ressaltando que eles renunciaram ao sistema de clientelismo romano, com suas reivindicações de poder, prestígio e status.

Antes de encerrarmos esse episódio, observemos mais um elemento. Os líderes em Jerusalém mostram notável consideração sobre a experiência dos obreiros no campo — Pedro, Paulo e Barnabé — que trabalham por conta própria, longe da sede, cada um enfrentando uma situação específica que exigia uma decisão prática. Os líderes em Jerusalém respeitam muito sua experiência e seu julgamento. Eles comunicam de forma cautelosa os princípios que devem orientar as decisões (At 15.19-21), mas delegam o processo decisório aos mais próximos da ação e confirmam as decisões tomadas por Pedro, Paulo e Barnabé no campo. Mais uma vez, trata-se de um afastamento radical do sistema de clientelismo romano, que concentrava poder e autoridade nas mãos do patrício.

Os efeitos benéficos da prática da educação uniforme sobre missão, princípios e valores, combinados com a delegação localizada da tomada de decisão e ação, são bem conhecidos devido à sua ampla adoção por instituições empresariais, militares, educacionais, sem fins lucrativos e governamentais na segunda metade do século 20. A gestão de praticamente todo tipo de organização foi radicalmente transformada por ela. A resultante liberação de criatividade, produtividade e serviço humanos não seria surpresa para os líderes da igreja primitiva, que experimentaram a mesma explosão na rápida expansão da igreja na era apostólica.

No entanto, não está claro se as igrejas de hoje adotaram plenamente essa lição no que diz respeito à atividade econômica. Por exemplo, os cristãos que trabalham em países em desenvolvimento frequentemente reclamam que são prejudicados por posturas rígidas das igrejas distantes do mundo desenvolvido. Boicotes bem-intencionados, regras de comércio justo e outras táticas de pressão podem ter consequências opostas às pretendidas. Um missionário de desenvolvimento econômico em um país asiático, por exemplo, relatou os resultados negativos causados pela imposição de restrições ao trabalho infantil por parte de sua organização patrocinadora nos Estados Unidos. Uma empresa que ele ajudava a desenvolver foi obrigada a parar de comprar materiais produzidos por trabalhadores com menos de dezesseis anos. Um de seus fornecedores era uma empresa composta por dois irmãos adolescentes. Por causa das novas restrições, a empresa teve que parar de comprar peças dos irmãos, o que deixou sua família sem nenhuma fonte de renda. Diante disso, sua mãe teve de voltar à prostituição, o que tornou as coisas muito piores para ela, os irmãos e o restante da família. “O que precisamos da igreja nos Estados Unidos é uma comunhão não opressiva”, disse o missionário mais tarde. “A obediência aos bem-intencionados ditames cristãos ocidentais significa que temos de ferir as pessoas em nosso país.” [1]

A comunidade do Espírito confronta os agentes do poder (At 16 e 19)

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Na segunda metade de Atos, Paulo, seus companheiros e várias comunidades cristãs entram em conflito com os que detêm o poder econômico e cívico local. O primeiro incidente ocorre em Antioquia da Pisídia, onde “as mulheres religiosas de elevada posição e os principais da cidade” (At 13.50) são incitados contra Paulo e Barnabé, terminando por expulsá-los da cidade. Então, em Icônio, Paulo e Barnabé são maltratados por “gentios e judeus, com os seus líderes” (At 14.5). Em Filipos, Paulo e Silas são presos por estarem “perturbando” a cidade (At 16.19-24). Paulo se desentende com os oficiais da cidade de Tessalônica (At 17.6-9) e com o procônsul da Acaia (At 18.12). Mais tarde, ele entra em conflito com a associação dos ourives de Éfeso (At 19.23-41). Os conflitos culminam com o julgamento de Paulo por perturbação da paz em Jerusalém, que ocupa os oito capítulos finais de Atos.

Esses confrontos com os poderes locais não devem ser surpresa, dada a vinda do Espírito de Deus anunciada por Pedro em Atos 2. Ali, vimos que a vinda do Espírito foi, de alguma forma misteriosa, o início do novo mundo de Deus. Isso certamente ameaçaria os poderes do velho mundo. Vimos que o Espírito trabalhou na comunidade para formar uma economia baseada em dons, muito diferente da economia romana baseada no clientelismo. As comunidades cristãs formavam um sistema dentro do sistema, em que os crentes, embora ainda participassem da economia romana, tinham uma maneira diferente de usar os recursos. O conflito com os líderes locais se devia precisamente ao fato de que o maior interesse deles era a manutenção da economia clientelista de Roma.

Os confrontos relatados em Atos 16.16-24 e Atos 19.23-41 merecem ambos uma discussão mais profunda. Neles, o caminho do reino colide de maneira intensa com as práticas econômicas do mundo romano.

Confronto em razão da libertação de uma escrava em Filipos (At 16.16-24)

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O primeiro dos dois confrontos ocorre em Filipos, onde Paulo e Silas encontram uma moça possuída por um espírito de adivinhação. [1] No contexto greco-romano, esse tipo de espírito estava associado à adivinhação — uma conexão que gerava “muito dinheiro para os seus senhores” (At 16.16). Esse parece ser um exemplo da forma mais grosseira de exploração econômica. É curioso que Paulo e Silas não ajam mais rapidamente (At 16.18). Talvez seja porque Paulo queira estabelecer uma conexão com seus donos antes de corrigi-los. Quando Paulo age, no entanto, o resultado é libertação espiritual para a moça e perda financeira para seus senhores. A reação dos proprietários é arrastar Paulo e Silas perante as autoridades, sob a acusação de perturbação da paz.

Esse incidente demonstra de forma poderosa que o ministério de libertação que Jesus proclamou em Lucas 4 pode contrariar pelo menos uma prática comercial comum, a exploração de escravos. Negócios que produzem lucro econômico às custas da exploração humana conflitam com o evangelho cristão. (Governos que exploram seres humanos são igualmente ruins. Discutimos anteriormente como a violência de Herodes contra seu povo — e até mesmo contra seus próprios soldados — o levou à morte nas mãos de um anjo do Senhor.) Paulo e Silas não estavam em uma missão para reformar as práticas econômicas e as políticas corruptas do mundo romano, mas o poder de Jesus de libertar as pessoas do pecado e da morte não se furta a quebrar os laços da exploração. Não pode haver libertação espiritual sem consequências econômicas. Paulo e Silas estavam dispostos a se expor ao ridículo, ao espancamento e à prisão a fim de trazer libertação econômica a alguém cujo gênero, situação econômica e idade a tornavam vulnerável a abusos.

Se olharmos dois mil anos adiante, será possível que os cristãos tenham se acomodado ou até lucrado com produtos, empresas, indústrias e governos que violam os princípios éticos e sociais cristãos? É fácil protestar contra indústrias ilegais, como as de narcóticos e a prostituição, mas e quanto às muitas indústrias legalizadas que prejudicam trabalhadores, consumidores ou o público em geral? E as brechas legais, os subsídios e as regulamentações governamentais injustos que beneficiam alguns cidadãos às custas de outros? Será que ao menos reconhecemos que talvez estejamos nos beneficiando da exploração de outros? Em uma economia global, pode ser difícil rastrear as condições e consequências da atividade econômica. É necessário discernir com base em informações confiáveis, e a comunidade cristã nem sempre foi rigorosa em suas críticas. O fato é que o livro de Atos não fornece princípios para avaliar a atividade econômica. Mas ele demonstra que questões econômicas são questões do evangelho. Nas pessoas de Paulo e Silas, dois dos maiores missionários e heróis da fé, vemos todo o exemplo de que precisamos de que os cristãos são chamados a enfrentar os abusos econômicos do mundo.

Os capítulos 17 e 18 contêm muito material interessante no que diz respeito ao trabalho, mas, para continuar a discussão dos confrontos decorrentes do desafio do evangelho aos sistemas do mundo, este artigo é seguido pelo relato do confronto no capítulo 19.21-41, retornando então aos capítulos 17, 18 e às outras partes do capítulo 19.

Confronto sobre a interrupção do comércio em Éfeso (At 19.21-41)

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A discussão a seguir está um pouco fora de ordem (vamos pular o relato de Atos 19.17-20, por enquanto) para que possamos cobrir o segundo incidente de confronto. Ele ocorre em Éfeso, onde fica o Templo de Ártemis (também conhecida pelo nome romano Diana). O culto a Ártemis em Éfeso era uma poderosa força econômica na Ásia Menor. Peregrinos afluíam ao templo (uma estrutura tão grandiosa a ponto de ser considerada uma das sete maravilhas do mundo antigo) na esperança de receber de Ártemis mais fertilidade na caça, no campo ou na família. Nesse contexto, tal como em outros centros turísticos, muitas das indústrias locais estavam ligadas à relevância contínua da atração. [19]

Um ourives chamado Demétrio, que fazia miniaturas de prata do templo de Ártemis e que dava muito lucro aos artífices, reuniu-os com os trabalhadores desse ramo e disse: “Senhores, vocês sabem que temos uma boa fonte de lucro nesta atividade e estão vendo e ouvindo como este indivíduo, Paulo, está convencendo e desviando grande número de pessoas aqui em Éfeso e em quase toda a província da Ásia. Diz ele que deuses feitos por mãos humanas não são deuses. Não somente há o perigo de nossa profissão perder sua reputação, mas também de o templo da grande deusa Ártemis cair em descrédito e de a própria deusa, adorada em toda a província da Ásia e em todo o mundo, ser destituída de sua majestade divina”. Ao ouvirem isso, eles ficaram furiosos e começaram a gritar: “Grande é a Ártemis dos efésios!” Em pouco tempo a cidade toda estava em tumulto. O povo foi às pressas para o teatro, arrastando os companheiros de viagem de Paulo, os macedônios Gaio e Aristarco. (Atos 19.24-29)

Como Demétrio reconhece, quando as pessoas se tornam seguidoras de Jesus, pode-se esperar que mudem seu jeito de usar o dinheiro. Deixar de comprar itens relacionados à adoração a ídolos é apenas a mudança mais óbvia. Também se pode esperar que os cristãos gastem menos com artigos de luxo para si mesmos e mais em coisas necessárias para o bem-estar dos outros. Talvez eles consumam menos, doem ou invistam mais de maneira geral. Não há nada que proíba os cristãos de comprarem itens de prata em geral. Mas Demétrio está certo em sua percepção de que os padrões de consumo mudarão se muitas pessoas começarem a acreditar em Jesus. Isso sempre será ameaçador para aqueles que lucram mais com o status quo das coisas.

Isso nos leva a pensar quais aspectos da vida econômica em nosso próprio contexto podem ser incompatíveis com o evangelho cristão. Por exemplo, é possível que, ao contrário dos temores de Demétrio, os cristãos tenham continuado a comprar bens e serviços incompatíveis com o fato de seguirem a Jesus? Tornamo-nos cristãos, mas continuamos a comprar o equivalente a miniaturas de prata do templo de Ártemis? Certos itens de marca “desejáveis” vêm à mente, e eles apelam aos desejos dos compradores de se associarem a status social, riqueza, poder, inteligência, beleza ou outros atributos implícitos na “promessa da marca”. Se os cristãos afirmam que sua posição vem exclusivamente do amor incondicional de Deus em Cristo, a associação pessoal com marcas funciona como um tipo de idolatria? Comprar uma marca de prestígio é essencialmente semelhante a comprar um santuário de prata para Ártemis? Esse incidente em Éfeso nos adverte de que seguir Jesus tem consequências econômicas que às vezes podem nos deixar desconfortáveis, para dizer o mínimo.

Envolvimento respeitoso com a cultura (Atos 17.16-34)

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Apesar da necessidade de confrontar os agentes do poder na cultura mais ampla, a confrontação nem sempre é a melhor maneira de a comunidade cristã se envolver com o mundo. Com muita frequência, embora a cultura seja equivocada, apresente dificuldades ou desconheça a graça de Deus, não é verdadeiramente opressora. Nesses casos, a melhor maneira de proclamar o evangelho pode ser cooperar com a cultura e envolver-se com ela de forma respeitosa.

Em Atos 17, Paulo nos fornece um exemplo de como envolver a cultura respeitosamente. Ele começa com a observação. Paulo passeia pelas ruas de Atenas e observa o templo dos vários deuses que ali encontra. Relata que observou “cuidadosamente” os “objetos de culto” que viu naquela cidade (At 17.23), os quais, destaca ele, foram feitos “pela arte e imaginação” das pessoas (At 17.29). Ele leu obras literárias deles, conhecendo-as tão bem a ponto de citá-las e tratando-as com respeito suficiente para incorporá-las a sua pregação sobre Cristo. De fato, Paulo afirma que a literatura deles contém até mesmo um pouco da verdade de Deus, pois ele a cita dizendo: “como disseram alguns dos poetas de vocês: ‘Também somos descendência dele’” (At 17.28). Um compromisso com a transformação radical da sociedade não significa que os cristãos tenham que se opor a tudo que diz respeito à sociedade. Ela não é totalmente ímpia — “pois nele vivemos, nos movemos e existimos” –, embora não tenha consciência de Deus.

Do mesmo modo, precisamos ser observadores no local de trabalho. Podemos encontrar muitas boas práticas nas escolas, nos negócios, no governo ou em outros locais de trabalho, mesmo que não derivem da comunidade cristã. Se formos verdadeiramente observadores, veremos que mesmo aqueles que não têm consciência de Cristo ou que o desprezam são feitos à imagem de Deus. Como Paulo, devemos cooperar com eles, em vez de tentar desacreditá-los. Podemos trabalhar com descrentes para melhorar as relações trabalhistas e administrativas, o atendimento ao cliente, a pesquisa e o desenvolvimento, a governança corporativa e cívica, a educação pública e outras áreas. Devemos fazer uso das habilidades e percepções desenvolvidas em universidades, corporações, organizações sem fins lucrativos e outros lugares. Nosso papel não é condenar o trabalho deles, mas aprofundá-lo e mostrar que se trata de uma prova de que Deus “não [está] longe de cada um de nós” (At 17.27). Imagine a diferença entre dizer “como você não conhece a Cristo, todo o seu trabalho está errado” e “como conheço a Cristo, acho que posso apreciar seu trabalho ainda mais do que você”.

No entanto, ao mesmo tempo, precisamos estar atentos ao quebrantamento e ao pecado evidentes no local de trabalho. Nosso propósito não é julgar, mas curar, ou pelo menos limitar os danos. Paulo é particularmente observador em relação ao pecado e à distorção da idolatria. “Paulo ficou profundamente indignado ao ver que a cidade estava cheia de ídolos.” (At 17.16) Assim como os ídolos da antiga Atenas, os ídolos dos locais de trabalho modernos são muitos e variados. Um líder cristão na cidade de Nova York diz:

Quando estou trabalhando com educadores, cujo ídolo é que todos os problemas do mundo serão resolvidos pela educação, meu coração se conecta ao coração deles no que tange ao desejo de resolver os problemas do mundo, mas eu lhes diria que não podem ir tão longe com a educação, mas sim que a verdadeira solução vem de Cristo. O mesmo vale para muitas outras profissões. [1]

Nossas observações cuidadosas, tal como as de Paulo, nos tornam testemunhas mais perspicazes do poder único de Cristo de corrigir o mundo.

No passado Deus não levou em conta essa ignorância, mas agora ordena que todos, em todo lugar, se arrependam. Pois estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça, por meio do homem que designou. E deu provas disso a todos, ressuscitando-o dentre os mortos. (Atos 17.30-31)

Fabricação de tendas e vida cristã (At 18.1-4)

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A passagem mais frequentemente ligada ao trabalho no livro de Atos é a fabricação de tendas realizada por Paulo em Atos 18.1-4. Embora essa passagem seja familiar, muitas vezes é entendida de forma muito restrita. Na leitura familiar, Paulo ganha dinheiro fazendo tendas a fim de se sustentar em seu ministério real de testemunhar de Cristo. Essa visão é muito estreita, porque não vê que a fabricação de tendas em si é um ministério real de testemunho de Cristo. Paulo é uma testemunha quando prega e quando faz tendas, e usa seus ganhos para beneficiar a comunidade em geral.

Isso se encaixa diretamente na visão de Lucas, segundo a qual o Espírito capacita os cristãos a usarem seus recursos para o bem de toda a comunidade, o que, por sua vez, se torna um testemunho do evangelho. É preciso lembrar que a ideia orientadora de Lucas para a vida cristã é a de testemunho, e a totalidade da vida de uma pessoa tem o potencial para testemunhar. É impressionante, então, que Paulo seja um exemplo dessa prática moldada pelo Espírito.

Certamente é verdade que Paulo quer se sustentar. No entanto, seu impulso não era apenas se sustentar em seu ministério de pregação, mas também fornecer apoio financeiro a toda a comunidade. Quando descreve seu impacto econômico entre os efésios, Paulo diz:

“Não cobicei a prata, nem o ouro, nem as roupas de ninguém. Vocês mesmos sabem que estas minhas mãos supriram minhas necessidades e as de meus companheiros. Em tudo o que fiz, mostrei a vocês que mediante trabalho árduo devemos ajudar os fracos, lembrando as palavras do próprio Senhor Jesus, que disse: ‘Há maior felicidade em dar do que em receber’” (Atos 20.33-35, ênfase adicionada)

O trabalho lucrativo de Paulo era um esforço para edificar economicamente a comunidade. [1] Paulo emprega suas habilidades e posses em prol da comunidade, e diz explicitamente que se trata de um exemplo a ser seguido. Ele não diz que todos devem seguir seu exemplo de pregação. Mas de fato diz que todos devem seguir seu exemplo de trabalhar para ajudar os fracos e doar generosamente, como o próprio Jesus ensinou. Ben Witherington argumenta de forma convincente que Paulo não está reivindicando nenhum status mais elevado em decorrência de sua posição apostólica, mas está “descendo a escada social por causa de Cristo”. [2]

Em outras palavras, Paulo não se envolve na fabricação de tendas porque precisa fazer seu “verdadeiro trabalho” de pregar. Em vez disso, as variedades de trabalho de Paulo — na oficina de costura, no mercado, na sinagoga, no auditório e na prisão — são todas formas de testemunho. Em qualquer um desses contextos, Paulo participa do projeto restaurador de Deus. Em qualquer um desses contextos, Paulo vive sua nova identidade em Cristo em favor da glória de Deus e por amor ao próximo — até mesmo aos seus antigos inimigos. Mesmo quando está sendo transportado pelo mar como prisioneiro, ele emprega seus dons de liderança e encorajamento para guiar em segurança, durante uma forte tempestade, os soldados e os marinheiros que o mantêm cativo (At 27.27-38). Se ele não tivesse o dom de ser pregador e apóstolo, ainda assim teria sido uma testemunha de Cristo simplesmente por seu engajamento na fabricação de tendas, no esforço pelo bem da comunidade e no trabalho pelo bem dos outros em todas as situações.

Fabricar tendas tornou-se uma metáfora comum para os cristãos que se envolvem em uma profissão remunerada como meio de apoiar o que é frequentemente chamado de “ministério profissional”. O termo “bivocacional” é frequentemente usado para indicar que duas profissões distintas estão envolvidas: a que gera renda e a do ministério. Mas o exemplo de Paulo mostra que todos os aspectos da vida humana devem ser um testemunho ininterrupto. Há pouco espaço para estabelecer distinções entre “ministério profissional” e outras formas de testemunho. De acordo com Atos, os cristãos, na verdade, têm apenas uma vocação: testemunhar do evangelho. Temos muitas formas de serviço, incluindo pregação e cuidado pastoral, fabricação de tendas, construção de móveis, doação de dinheiro e assistência aos fracos. Um cristão que se envolve em uma profissão remunerada, como a de fabricar tendas, a fim de apoiar uma profissão não remunerada, como ensinar sobre Jesus, seria descrito com mais precisão como alguém que possui um “serviço duplo”, em vez de “bivocacionado” — um chamado, duas formas de serviço. O mesmo se aplica a qualquer cristão que sirva em mais de uma frente de trabalho.

O evangelho e os limites da vocação e do engajamento (At 19.17-20)

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A passagem de Atos 19.13-16 apresenta uma história estranha que leva ao arrependimento de um “grande número dos que tinham praticado ocultismo” (At 19.19). Eles reuniram seus livros de magia e os queimaram publicamente, e Lucas nos diz que o valor dos pergaminhos queimados por esses convertidos foi de 50.000 dracmas. Isso foi estimado como o equivalente a 137 anos de salário contínuo de um diarista ou a pão suficiente para alimentar 100 famílias por 500 dias. [1] A incorporação à comunidade do reino de Deus tem um enorme impacto econômico e vocacional.

Embora não possamos ter certeza de que aqueles que se arrependeram de seu envolvimento com o ocultismo estavam se arrependendo de um meio de ganhar a vida, é improvável que uma coleção tão cara de livros tenha sido mero hobby. Vemos aqui que a mudança na vida promovida pela fé em Jesus se reflete imediatamente em uma decisão vocacional — um resultado conhecido do Evangelho de Lucas. Nesse caso, os crentes acharam necessário abandonar completamente sua antiga ocupação.

Em muitos outros casos, embora seja possível permanecer na vocação, é necessário praticá-la diferentemente. Imagine, por exemplo, que um vendedor criou um negócio vendendo seguros desnecessários para idosos. Essa pessoa teria de interromper essa prática, mas poderia continuar na profissão de vendedor de seguros, mudando para uma linha de produtos benéfica para quem a compra. As comissões podem ser menores (ou não), mas a profissão tem muito espaço para um sucesso legítimo e para muitos participantes éticos.

Uma situação muito mais difícil ocorre em profissões que poderiam ser exercidas legitimamente, mas nas quais as práticas ilícitas possuem ramificações tão profundas que é difícil competir sem violar os princípios bíblicos. Muitos funcionários públicos em países com alto índice de corrupção enfrentam esse dilema. É possível ser um inspetor de obras honesto, mas será muito difícil se seu salário oficial for equivalente a US$ 10 por semana e seu supervisor exigir uma taxa de US$ 100 por mês para permitir que você mantenha seu emprego. Um crente nessa situação enfrenta uma escolha difícil. Se todas as pessoas honestas deixarem a profissão, tanto pior para o público. Mas, se é difícil ou impossível ganhar a vida honestamente na profissão, como um cristão pode permanecer nela? Isso é algo que Lucas discute em Lucas 3.9, quando João Batista aconselha soldados e cobradores de impostos a permanecerem em seu emprego, mas a cessarem a extorsão e a fraude praticadas pela maioria dos que têm essa profissão. (Veja “Lucas 3.8-14” em Lucas e o trabalho em www.teologiadotrabalho.org para saber mais sobre esta passagem.)

Quatro atributos da liderança de Paulo como testemunha (At 20—28)

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Os últimos nove capítulos de Atos apresentam um relato repleto de ação sobre um atentado contra a vida de Paulo, seguido por sua prisão pelas mãos de dois governadores romanos e sua angustiante jornada a bordo de um navio até o julgamento em Roma. Em muitos aspectos, a experiência de Paulo recapitula o ponto culminante do ministério de Jesus, e Atos 20—28 pode ser pensado como uma espécie de Paixão de Paulo. Nesses capítulos, o aspecto mais relevante para o trabalho é a descrição da liderança de Paulo. Vamos nos concentrar no que vemos de sua coragem, seu sofrimento, seu respeito pelo outro e sua preocupação com o bem-estar das pessoas.

A coragem de Paulo (At 20—28)

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Após os conflitos em Filipos e em Éfeso, Paulo recebe ameaças de prisão (At 20.23, 21.11) e morte (At 20.3, 23.12-14). Essas ameaças não são vãs, pois, de fato, duas tentativas são feitas contra sua vida (At 21.3; 23.21). Paulo é levado sob custódia pelo governo romano (At 23.10) e um processo é movido contra ele (At 24.1-9), que, embora falso, em última análise, leva à sua execução. Dados os episódios de conflito que já exploramos, não é surpresa que seguir os caminhos do reino de Deus leve a um conflito com os caminhos opressivos do mundo.

No entanto, apesar de tudo, Paulo mantém uma coragem extraordinária. Ele dá continuidade ao seu trabalho (pregação) apesar das ameaças, e até se atreve a pregar a seus captores, tanto judeus (At 23.1-10) quanto romanos (At 24.21-26; 26.32; 28.30-31). No final, sua coragem se mostra decisiva não apenas para sua obra de pregação, mas para salvar a vida de centenas de pessoas no meio de um naufrágio (At 27.22-23). Suas próprias palavras resumem sua atitude de coragem, enquanto aqueles ao seu redor recuam com medo. “Por que vocês estão chorando e partindo o meu coração? Estou pronto não apenas para ser amarrado, mas também para morrer em Jerusalém pelo nome do Senhor Jesus.” (At 21.13)

A questão, porém, não é que Paulo seja um homem de extraordinária coragem, mas que o Espírito Santo dá a cada um de nós a coragem de que precisamos para realizar nosso trabalho. Paulo reconhece que é o Espírito Santo que o mantém diante de tal adversidade (At 20.22; 21.4; 23.11). Isso é um encorajamento para nós hoje, porque também podemos depender do Espírito Santo para nos dar a coragem que talvez nos falte. O perigo não é tanto que a coragem possa nos faltar no momento de maior terror, mas que essa preocupação geral venha a nos impedir de dar o primeiro passo para seguir os caminhos do reino de Deus no trabalho. Com que frequência deixamos de defender um colega, atender a um cliente, desafiar um chefe ou falar sobre um problema, não porque estejamos realmente sob pressão, mas porque temos medo de ofender alguém em posição de autoridade? E se adotássemos a posição de que, antes de agirmos contrariamente aos caminhos de Deus no trabalho, pelo menos precisássemos receber uma ordem real para fazê-lo? Poderíamos começar contando com o Espírito Santo para nos sustentar pelo menos até esse ponto?

O sofrimento de Paulo (At 20—28)

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Paulo precisa de cada grama de coragem por causa dos pesados ​​sofrimentos que ele sabe que seu trabalho trará. “Em todas as cidades, o Espírito Santo me avisa que prisões e sofrimentos me esperam” (At 20.23), diz ele. Ele é sequestrado (At 21.27), espancado (At 21.30-31; 23.3), ameaçado (At 22.22; 27.42), preso muitas vezes (At 21.33; 22.24,31; 23.35; 28.16), acusado em processos (At 21.34; 22.30; 24.1-2; 25.2,7; 28.4), interrogado (At 25.24-27), ridicularizado (At 26.24), ignorado (At 27.11), sofre naufrágio (At 27.41) e é mordido por uma víbora (At 28.3). A tradição diz que Paulo acabou sendo condenado à morte por seu trabalho, embora isso não seja relatado em nenhum lugar da Bíblia.

A liderança em um mundo quebrado implica sofrimento. Qualquer um que não aceite o sofrimento como um elemento essencial da liderança não pode ser líder, pelo menos não como Deus deseja. Nisso vemos outra refutação radical do sistema de clientelismo romano. O sistema romano é estruturado para isolar o patrício do sofrimento. Somente os patrícios, por exemplo, tinham o direito de escapar de violações corporais, como vemos quando o status de Paulo como cidadão romano (um patrício, embora de uma casa de um só membro da família) é a única coisa que o protege de um açoitamento arbitrário (At 22.29). Paulo, no entanto, abraça o sofrimento corporal, junto com muitas outras formas, como a necessidade de um líder no caminho de Jesus. Hoje, podemos procurar nos tornar líderes pela mesma razão pela qual os homens da Roma antiga procuravam exercer o patronato — para evitar o sofrimento. Podemos ter sucesso em ganhar poder e talvez até em nos isolar das mazelas do mundo. Mas nossa liderança não será capaz de beneficiar os outros se não aceitarmos a dor em nós mesmos, em maior ou menor grau. E, se nossa liderança não beneficia os outros, não é o tipo de liderança de Deus.

O respeito de Paulo (At 20—28)

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Apesar da total convicção de Paulo sobre suas crenças e sua conduta, ele mostra respeito por todos que encontra. Isso deixa todos sem ação, especialmente seus inimigos e captores, o que lhe dá uma oportunidade incontestável como testemunha do reino de Deus. Quando chega a Jerusalém, ele respeita os líderes cristãos judeus de lá e atende ao estranho pedido deles de demonstrar sua fidelidade contínua à Lei judaica (At 21.17-26). Ele fala respeitosamente a uma multidão que acaba de espancá-lo (At 21.30—22.21), a um soldado que está prestes a açoitá-lo (At 22.25-29), ao conselho judaico que o acusa em um tribunal romano — até o ponto de se desculpar por inadvertidamente insultar o sumo sacerdote — (At 23.1-10), ao governador romano Félix e sua esposa Drusila (At 24.10-26), ao sucessor de Félix, Festo (At 25.8-11; 26.24-26) e ao rei Agripa e sua esposa, Berenice (At 26.2-29), que o aprisionam. Em sua jornada até lá, trata com respeito o centurião Júlio (At 27.3), o governador de Malta (At 28.7-10) e os líderes da comunidade judaica em Roma (At 28.17-28).

Não devemos confundir o respeito demonstrado por Paulo com timidez em relação à sua mensagem. Paulo nunca hesita em proclamar a verdade com ousadia, onde quer que haja condições favoráveis. Depois de ser espancado por uma multidão de judeus em Jerusalém, que falsamente suspeitam que ele tenha trazido um gentio ao templo, ele lhes prega um sermão cuja conclusão é o comissionamento do Senhor Jesus a que pregue a salvação aos gentios (At 22.17-21). Ele diz ao conselho judaico em Atos 23.1-8: “Estou sendo julgado por causa da minha esperança na ressurreição dos mortos!” (At 23.6). Ele proclama o evangelho a Félix (At 24.14-16) e também a Festo, Agripa e Berenice: “Estou sendo julgado por causa da minha esperança no que Deus prometeu aos nossos antepassados” (At 26.6). Adverte os soldados e marinheiros no barco para Roma de que a “viagem será desastrosa e acarretará grande prejuízo para o navio, para a carga e também para a nossa vida” (At 27.10). O livro de Atos termina com a informação de que Paulo “pregava o Reino de Deus e ensinava a respeito do Senhor Jesus Cristo, abertamente, sem impedimento algum” (At 28.30-31).

O respeito de Paulo pelos outros muitas vezes chama atenção para ele e até transforma inimigos em amigos, apesar da ousadia de suas palavras. O centurião prestes a açoitá-lo intervém junto ao comandante romano, que ordena que ele seja libertado (At 22.26-29). Os fariseus concluem: “Não encontramos nada de errado neste homem. Quem sabe se algum espírito ou anjo falou com ele?” (At 23.9). Félix determina que “não havia contra [Paulo] nenhuma acusação que merecesse morte ou prisão” (At 23.29) e se torna um ouvinte ávido que “mandava buscá-lo frequentemente e conversava com ele” (At 24.26). Agripa, Berenice e Festo chegam à conclusão de que Paulo é inocente, e Agripa começa a ser persuadido pela pregação de Paulo. “Você acha que em tão pouco tempo pode convencer-me a tornar-me cristão?”, pergunta (At 26.28). No final da viagem a Roma, Paulo se torna o líder de fato do navio, emitindo ordens que o capitão e o centurião ficariam felizes em obedecer (At 27.42-44). Em Malta, o governador recebe e hospeda Paulo e seus companheiros e, mais tarde, abastece seu navio e os despede com honras (At 28.10).

Nem todos retribuem o respeito de Paulo com respeito, é claro. Alguns o difamam, rejeitam, ameaçam e abusam dele. Mas, de modo geral, ele recebe muito mais respeito das pessoas do que os mestres do sistema de clientelismo romano entre os quais opera. O exercício do poder pode exigir a aparência de respeito, mas o exercício do verdadeiro respeito tem muito mais probabilidade de ganhar uma resposta de respeito verdadeiro.

A preocupação de Paulo com os outros (At 20—28)

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Acima de tudo, a liderança de Paulo é marcada por sua preocupação com os outros. Ele aceita o fardo da liderança não para melhorar sua vida, mas para melhorar a vida dos outros. Sua própria disposição de viajar a lugares hostis para pregar um modo de vida melhor é prova suficiente disso. No entanto, também vemos sua preocupação com os outros de maneira concreta e pessoal. Ele cura um jovem gravemente ferido por ter caído de uma janela do andar superior (At 20.9-12). Prepara as igrejas que plantou para que prossigam após sua morte e as encoraja quando são dominadas pelo choro (At 20.37). Procura pregar as boas-novas até mesmo para aqueles que tentam matá-lo (At 22.1-21). Cura todos os doentes na ilha de Malta (At 28.8-10).

Um exemplo notável de sua preocupação com os outros ocorre durante o naufrágio. Embora seu aviso para não fazer a viagem tenha sido ignorado, Paulo ajuda e encoraja a tripulação e os passageiros quando a tempestade chega.

Visto que os homens tinham passado muito tempo sem comer, Paulo levantou-se diante deles e disse: “Os senhores deviam ter aceitado o meu conselho de não partir de Creta, pois assim teriam evitado este dano e prejuízo. Mas agora recomendo que tenham coragem, pois nenhum de vocês perderá a vida; apenas o navio será destruído. Pois ontem à noite apareceu-me um anjo do Deus a quem pertenço e a quem adoro, dizendo-me: ‘Paulo, não tenha medo. É preciso que você compareça perante César; Deus, por sua graça, deu-lhe a vida de todos os que estão navegando com você’. Assim, tenham ânimo, senhores! Creio em Deus que acontecerá conforme me foi dito”. (At 27.21-25)

Sua preocupação não termina com palavras de encorajamento, mas prossegue com atos práticos. Ele garante que todos comam para manter as forças (At 27.34-36). Elabora um plano que salvará a vida de todos, incluindo aqueles que não sabem nadar (At 27.26,38,41,44). Dirige os preparativos para encalhar o navio (At 27.43b) e impede que os marinheiros abandonem os soldados e passageiros (At 27.30-32). Como resultado de suas preocupações e ações, nem uma única vida se perde no naufrágio (At 27.44).

A liderança de Paulo abrange muito mais que os quatro fatores de coragem, sofrimento, respeito e preocupação pelos outros, e é visível muito além de Atos 20—28. No entanto, esses fatores, conforme apresentados nesses capítulos, formam uma das mais comoventes demonstrações de liderança na Bíblia e continuam a ser um exemplo hoje tanto quanto foram nos dias de Lucas.

Conclusão de Atos

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Investigar o trabalho e questões relacionadas a ele em Atos apresenta um tratamento coerente da vocação no mundo de Deus. Em Atos, a visão cristã do trabalho não é relegada simplesmente ao âmbito da ética. Em vez disso, é uma forma ativa de testemunho da redenção do mundo por Deus. A lógica de Atos se move na seguinte direção:

1. A vinda do Espírito dá início ao reino de Cristo — o novo mundo de Deus –, que opera de uma maneira nova. O sistema de clientelismo romano, que buscava status para si mesmo, é substituído por um espírito de amor que busca o bem dos outros. Isso segue o exemplo de Jesus, que se entrega pelo bem dos outros — algo evidente, acima de tudo, na cruz.

2. A vocação cristã é conceituada como um testemunho do reino de Cristo, capacitado pelo Espírito, não apenas por proclamação, mas também por ações realizadas em concordância com o espírito de amor de Deus na vida cotidiana.

3. A vocação cristã é dada à comunidade de crentes como um todo, não apenas a indivíduos. A prática dos crentes não é perfeita — às vezes, fica muito longe disso — e, no entanto, é uma participação real no novo mundo.

4. A comunidade dá testemunho do reino de Cristo trabalhando e usando recursos relacionados ao trabalho — poder, riqueza e status — em prol dos outros e da comunidade como um todo. A participação na comunidade anda de mãos dadas com um modo de vida transformado, que leva ao amor e ao serviço. Um resultado exemplar é a prática da generosidade radical envolvendo todo tipo de recurso.

5. Quando o trabalho é realizado dessa maneira, qualquer profissão pode ser um ato de testemunho através da prática das estruturas de justiça, retidão e beleza trazidas pelo reino de Deus.

6. A comunidade cristã, portanto, produz uma maneira de trabalhar que desafia as estruturas do mundo caído e, às vezes, se coloca em conflito com os detentores do poder do mundo. No entanto, a intenção da comunidade não é colidir com o mundo, mas transformá-lo.

7. A liderança é uma arena proeminente na qual se efetiva o novo espírito de amor e serviço ao próximo. A autoridade é compartilhada e a liderança, encorajada em todos os níveis da comunidade. Os líderes aceitam o fardo de agir pelo bem dos outros e respeitam a sabedoria e a autoridade daqueles que lideram. Os atributos de liderança — incluindo coragem, sofrimento, respeito e preocupação com os outros — vêm à tona no exemplo do apóstolo Paulo.

Atos nos ajuda a ver que a vida humana como um todo — incluindo o trabalho e seus frutos — pode ser um meio de participar, através do poder do Espírito que já está emergindo, da vinda do reino de Deus à terra. Dessa forma, o trabalho não é apenas digno, mas também essencial para a vocação humana de testemunho. Como era desde o início, o trabalho é um ponto central do que significa ser plenamente humano. Os trabalhadores de hoje são chamados a ser cultivadores e transformadores da terra, da cultura, da família, dos negócios, da educação, da justiça e de todas as outras esferas — tudo por causa do reino de Deus.

Versículos-chave e temas em Atos

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Versículo

Tema

Atos 1.6 Então os que estavam reunidos lhe perguntaram: “Senhor, é neste tempo que vais restaurar o reino a Israel?”.

A vida cristã ocorre em uma comunidade que tem como base uma vocação para o reino de Deus

Atos 1.8 Mas receberão poder quando o Espírito Santo descer sobre vocês, e serão minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria, e até os confins da terra.

A comunidade cristã tem seu foco no testemunho do reino de Deus na vida cotidiana.

Atos 2.17-21 Nos últimos dias, diz Deus, derramarei do meu Espírito sobre todos os povos. Os seus filhos e as suas filhas profetizarão, os jovens terão visões, os velhos terão sonhos. Sobre os meus servos e as minhas servas derramarei do meu Espírito naqueles dias, e eles profetizarão [...] antes que venha o grande e glorioso dia do Senhor. E todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo!

A vida cristã é a participação no novo mundo de Deus

Atos 2.40 Com muitas outras palavras os advertia e insistia com eles: “Salvem-se desta geração corrompida!”.

A vida cristã é a participação no novo mundo de Deus

Atos 2.42-47 Eles se dedicavam ao ensino dos apóstolos e à comunhão, ao partir do pão e às orações. [...] Os que criam mantinham-se unidos e tinham tudo em comum. Vendendo suas propriedades e bens, distribuíam a cada um conforme a sua necessidade. [...] E o Senhor lhes acrescentava diariamente os que iam sendo salvos.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 3.6 Disse Pedro: “Não tenho prata nem ouro, mas o que tenho, isto lhe dou. Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, ande”.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 4.18-21 Então, chamando-os novamente, ordenaram-lhes que não falassem nem ensinassem em nome de Jesus. Mas Pedro e João responderam: “Julguem os senhores mesmos se é justo aos olhos de Deus obedecer aos senhores e não a Deus. Pois não podemos deixar de falar do que vimos e ouvimos”. [...] Todo o povo estava louvando a Deus pelo que acontecera.

Deus é soberano sobre os sistemas de poder

Atos 4.25-26 Tu falaste pelo Espírito Santo por boca do teu servo, nosso pai Davi: “Por que se enfurecem as nações, e os povos conspiram em vão? Os reis da terra se levantam, e os governantes se reúnem contra o Senhor e contra o seu Ungido”.

Deus é soberano sobre os sistemas de poder

Atos 4.32-37 Da multidão dos que creram, uma era a mente e um o coração. Ninguém considerava unicamente sua coisa alguma que possuísse, mas compartilhavam tudo o que tinham. [...] José, um levita de Chipre [...], vendeu um campo que possuía, trouxe o dinheiro e o colocou aos pés dos apóstolos.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 5.1-11 Um homem chamado Ananias, com Safira, sua mulher, também vendeu uma propriedade. Ele reteve parte do dinheiro para si, sabendo disso também sua mulher; e o restante levou e colocou aos pés dos apóstolos. Então perguntou Pedro: “Ananias, como você permitiu que Satanás enchesse o seu coração, a ponto de você mentir ao Espírito Santo e guardar para você uma parte do dinheiro que recebeu pela propriedade?” [...] Ouvindo isso, Ananias caiu morto. [...] E grande temor apoderou-se de toda a igreja e de todos os que ouviram falar desses acontecimentos.

Poder, status e recursos devem ser usados ​​para o bem da comunidade

Atos 5.27-32 Tendo levado os apóstolos, apresentaram-nos ao Sinédrio para serem interrogados pelo sumo sacerdote, que lhes disse: “Demos ordens expressas a vocês para que não ensinassem neste nome. Todavia, vocês encheram Jerusalém com sua doutrina e nos querem tornar culpados do sangue desse homem”. Pedro e os outros apóstolos responderam: “É preciso obedecer antes a Deus do que aos homens! [...] Nós somos testemunhas destas coisas, bem como o Espírito Santo, que Deus concedeu aos que lhe obedecem”.

Deus é soberano sobre os sistemas de poder

Atos 6.1-7 Naqueles dias, crescendo o número de discípulos, os judeus de fala grega entre eles queixaram-se dos judeus de fala hebraica, porque suas viúvas estavam sendo esquecidas na distribuição diária de alimento. Por isso os Doze reuniram todos os discípulos e disseram: “Não é certo negligenciarmos o ministério da palavra de Deus, a fim de servir às mesas. Irmãos, escolham entre vocês sete homens de bom testemunho, cheios do Espírito e de sabedoria. Passaremos a eles essa tarefa e nos dedicaremos à oração e ao ministério da palavra”. [...] Crescia rapidamente o número de discípulos em Jerusalém; também um grande número de sacerdotes obedecia à fé.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 8.18-24 Vendo Simão que o Espírito era dado com a imposição das mãos dos apóstolos, ofereceu-lhes dinheiro e disse: “Deem-me também este poder, para que a pessoa sobre quem eu puser as mãos receba o Espírito Santo”. Pedro respondeu: “Pereça com você o seu dinheiro! Você pensa que pode comprar o dom de Deus com dinheiro?” [...]. Simão, porém, respondeu: “Orem vocês ao Senhor por mim, para que não me aconteça nada do que vocês disseram”.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 8.26-40 Um anjo do Senhor disse a Filipe: “Vá para o sul, para a estrada deserta que desce de Jerusalém a Gaza”. [...] No caminho encontrou um eunuco etíope [... que] viera a Jerusalém para adorar a Jesus e, de volta para casa, sentado em sua carruagem, lia o livro do profeta Isaías. E o Espírito disse a Filipe: “Aproxime-se dessa carruagem e acompanhe-a”. [...] Então Filipe, começando com aquela passagem da Escritura, anunciou-lhe as boas-novas de Jesus. Prosseguindo pela estrada, chegaram a um lugar onde havia água. O eunuco disse: “Olhe, aqui há água. Que me impede de ser batizado?”[...]. Assim, deu ordem para parar a carruagem. Então Filipe e o eunuco desceram à água, e Filipe o batizou...

Poder, status e recursos não são substitutos de um relacionamento com Deus

Atos 9.36-42 Em Jope havia uma discípula chamada Tabita, que em grego é Dorcas, que se dedicava a praticar boas obras e dar esmolas. Naqueles dias ela ficou doente e morreu, e seu corpo foi lavado e colocado num quarto do andar superior. [...] Pedro mandou que todos saíssem do quarto; depois, ajoelhou-se e orou. Voltando-se para a mulher morta, disse: “Tabita, levante-se”. Ela abriu os olhos e, vendo Pedro, sentou-se. Tomando-a pela mão, ajudou-a a pôr-se em pé. Então, chamando os santos e as viúvas, apresentou-a viva. Este fato se tornou conhecido em toda a cidade de Jope, e muitos creram no Senhor.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 9.43 Pedro ficou em Jope durante algum tempo, com um curtidor de couro chamado Simão.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 10.24 No outro dia chegaram a Cesareia. Cornélio os esperava com seus parentes e amigos mais íntimos que tinha convidado.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 11.27-30 Naqueles dias alguns profetas desceram de Jerusalém para Antioquia. Um deles, Ágabo, levantou-se e pelo Espírito predisse que uma grande fome sobreviria a todo o mundo romano, o que aconteceu durante o reinado de Cláudio. Os discípulos, cada um segundo as suas possibilidades, decidiram providenciar ajuda para os irmãos que viviam na Judeia. E o fizeram, enviando suas ofertas aos presbíteros pelas mãos de Barnabé e Saulo.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 12.20-23 [Herodes] estava cheio de ira contra o povo de Tiro e Sidom; contudo, eles haviam se reunido e procuravam ter uma audiência com ele. Tendo conseguido o apoio de Blasto, homem de confiança do rei, pediram paz, porque dependiam das terras do rei para obter alimento. No dia marcado, Herodes, vestindo seus trajes reais, sentou-se em seu trono e fez um discurso ao povo. Eles começaram a gritar: “É voz de deus, e não de homem”. Visto que Herodes não glorificou a Deus, imediatamente um anjo do Senhor o feriu; e ele morreu comido por vermes.

Toda autoridade vem de Deus

Deus é soberano sobre os sistemas de poder

Atos 13.1-3 Na igreja de Antioquia havia profetas e mestres: Barnabé, Simeão, chamado Níger, Lúcio de Cirene, Manaém, que fora criado com Herodes, o tetrarca, e Saulo. Enquanto adoravam o Senhor e jejuavam, disse o Espírito Santo: “Separem-me Barnabé e Saulo para a obra a que os tenho chamado”. Assim, depois de jejuar e orar, impuseram-lhes as mãos e os enviaram.

O discernimento de uma vocação em particular é feito dentro da comunidade cristã

Atos 13.50 Mas os judeus incitaram as mulheres religiosas de elevada posição e os principais da cidade. E, provocando perseguição contra Paulo e Barnabé, os expulsaram do seu território.

A vida cristã produz confronto com os poderosos

Atos 16.11-15 Partindo de Trôade, navegamos diretamente para Samotrácia e, no dia seguinte, para Neápolis. Dali partimos para Filipos, na Macedônia, que é colônia romana [...]. O Senhor abriu [o coração de Lídia] para atender à mensagem de Paulo. Tendo sido batizada, bem como os de sua casa, ela nos convidou, dizendo: “Se os senhores me consideram uma crente no Senhor, venham ficar em minha casa”. E nos convenceu.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 16.16-24 Certo dia, indo nós para o lugar de oração, encontramos uma escrava que tinha um espírito pelo qual predizia o futuro. Ela ganhava muito dinheiro para os seus senhores com adivinhações. Essa moça seguia Paulo e a nós, gritando: “Estes homens são servos do Deus Altíssimo e anunciam o caminho da salvação”. Ela continuou fazendo isso por muitos dias. Finalmente, Paulo ficou indignado, voltou-se e disse ao espírito: “Em nome de Jesus Cristo eu ordeno que saia dela!” No mesmo instante o espírito a deixou. Percebendo que a sua esperança de lucro tinha se acabado, os donos da escrava agarraram Paulo e Silas e os arrastaram para a praça principal, diante das autoridades. [...]

O evangelho liberta do mal manifestado por meio de práticas econômicas opressivas

Atos 17.12 E creram muitos dentre os judeus e também um bom número de mulheres gregas de elevada posição e não poucos homens gregos.

A igreja tem diversidade econômica

Atos 18.3-4 Uma vez que tinham a mesma profissão, ficou morando e trabalhando com eles, pois eram fabricantes de tendas. Todos os sábados ele debatia na sinagoga e convencia judeus e gregos.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 19.19 Grande número dos que tinham praticado ocultismo reuniram seus livros e os queimaram publicamente. Calculado o valor total, este chegou a cinquenta mil dracmas.

Algumas vocações em particular são inimigas do Evangelho

Atos 19.23-41 Naquele tempo houve um grande tumulto por causa do Caminho. Um ourives chamado Demétrio, que fazia miniaturas de prata do templo de Ártemis e que dava muito lucro aos artífices, reuniu-os com os trabalhadores dessa profissão e disse: “[... Paulo] está convencendo e desviando grande número de pessoas aqui em Éfeso e em quase toda a província da Ásia. Diz ele que deuses feitos por mãos humanas não são deuses. [...]” Ao ouvirem isso, eles ficaram furiosos e começaram a gritar: “Grande é a Ártemis dos efésios!” Em pouco tempo a cidade toda estava em tumulto. O povo foi às pressas para o teatro, arrastando os companheiros de viagem de Paulo, os macedônios Gaio e Aristarco. [...] O escrivão da cidade acalmou a multidão e disse: “[...] Da maneira como está, corremos o perigo de sermos acusados de perturbar a ordem pública por causa dos acontecimentos de hoje [...]”. E, tendo dito isso, encerrou a assembleia.

A vida cristã produz confronto com os poderosos

Atos 20.33-35 Não cobicei a prata, nem o ouro, nem as roupas de ninguém. Vocês mesmos sabem que estas minhas mãos supriram minhas necessidades e as de meus companheiros. Em tudo o que fiz, mostrei a vocês que mediante trabalho árduo devemos ajudar os fracos, lembrando as palavras do próprio Senhor Jesus, que disse: “Há maior felicidade em dar do que em receber”.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 21.8 Partindo no dia seguinte, chegamos a Cesareia e ficamos na casa de Filipe, o evangelista, um dos sete.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade

Atos 27.11 Mas o centurião, em vez de ouvir o que Paulo falava, seguiu o conselho do piloto e do dono do navio.

Poder, status e recursos devem ser usados para o bem da comunidade