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O discípulo a quem Jesus amava (Jo 21.20)

Comentário Bíblico / Produzido por Projeto Teologia do Trabalho
Beloved disciples

O capítulo final de João oferece uma oportunidade para refletir não tanto sobre o trabalho em si, mas sobre a identidade do trabalhador. Os discípulos estavam pescando quando encontraram Jesus. Isso às vezes é visto como algo ruim, como se eles pescassem quando deveriam estar pregando o reino de Deus. Mas não há nada no texto que sugira desaprovação. Em vez disso, Jesus abençoa o trabalho deles com uma pesca milagrosa. Depois disso, eles retornam ao trabalho que lhes foi designado como pregadores, mas mesmo essa atitude reflete apenas seu chamado específico, sem representar um desprezo pela pesca em si.

Seja como for, o ponto alto do capítulo é a restauração de Pedro e o contraste do futuro de Pedro com o do “discípulo a quem Jesus amava” (Jo 21.20). A tríplice afirmação de Pedro quanto a seu amor pelo Mestre restaura seu relacionamento com Jesus após sua tríplice negação anterior. Olhando para o futuro, Pedro suportará o martírio, ao mesmo tempo em que é enigmaticamente sugerido que o Discípulo Amado desfrutará de uma vida mais longa. Concentraremos nossa atenção nesta última figura, uma vez que sua autodesignação fala diretamente à questão da identidade humana.

É curioso que a identidade do Discípulo Amado nunca seja revelada no Quarto Evangelho. A maioria dos estudiosos deduz que ele é o apóstolo João (embora haja alguns dissidentes [1]), mas a verdadeira questão é por que ele esconde seu nome com tanto sigilo. Uma possível resposta seria que ele deseja se distinguir dos outros discípulos. Ele é amado de modo especial por Jesus. Mas seria um motivo estranho em um Evangelho permeado pelo modelo de humildade e abnegação de Cristo.

Uma explicação muito melhor é que ele se autodenomina o “discípulo a quem Jesus amava” como uma forma de representar o que é verdade em relação a todos os discípulos. Todos devemos encontrar nossa identidade, acima de tudo, no fato de que Jesus nos ama. Quando você pergunta a João quem ele é, ele não responde revelando seu nome, suas conexões familiares ou sua ocupação. Ele responde: “Eu sou alguém que Jesus ama”. Nas palavras de João, o Discípulo Amado se encontra “reclinado no seio de Jesus” (Jo 13.23, ARC) e, da mesma forma, o Messias encontra sua identidade “no seio do Pai” (Jo 1.18, ARC). [2] Da mesma forma, devemos descobrir quem somos não naquilo que fizemos, ou em quem conhecemos, ou no que temos, mas no amor de Jesus por nós.

No entanto, se o amor de Jesus por nós — ou, poderíamos dizer, o amor do Pai por nós por meio de Jesus — se tornar a fonte de nossa identidade e a motivação de nossa vida, desenvolveremos esse amor em nossa atividade na criação de Deus. Um aspecto crucial dessa atividade é o nosso trabalho diário. Por meio da graça de Deus, o trabalho pode se tornar uma arena na qual vivemos nosso relacionamento com Deus e com os outros por meio do serviço amoroso. Nosso trabalho diário, por mais humilde ou exaltado que seja na opinião dos outros, torna-se o lugar onde a glória de Deus é exibida. Pela graça de Deus, ao trabalharmos, tornamo-nos parábolas vivas do amor e da glória de Deus.