Aguardando a colheita (Tg 5.7-20)
Comentário Bíblico / Produzido por Projeto Teologia do TrabalhoTiago conclui sua carta com uma variedade de exortações sobre paciência, veracidade, oração, confissão e cura. Como sempre, elas apelam para o princípio de que obras fiéis devem beneficiar os outros ou ser feitas na dependência de Deus, ou ambos. E, como sempre, Tiago faz aplicações diretas ao trabalho.
Paciência
Tiago começa com um exemplo de trabalho para ilustrar o iminente retorno de Cristo: “Portanto, irmãos, sejam pacientes até a vinda do Senhor. Vejam como o agricultor aguarda que a terra produza a preciosa colheita e como espera com paciência até virem as chuvas do outono e da primavera. Sejam também pacientes e fortaleçam o coração de vocês, pois a vinda do Senhor está próxima”(Tg 5.7-8). E, no final, ele ecoa essas palavras: “Elias era humano como nós. Ele orou fervorosamente para que não chovesse, e não choveu sobre a terra durante três anos e meio. Depois, orou novamente, e os céus enviaram chuva, e a terra produziu os seus frutos” (Tg 5.17-18).
A paciência no trabalho é uma forma de dependência de Deus. Mas no trabalho a paciência é difícil. Sua finalidade é obter resultados — caso contrário, não seria trabalho — e sempre existe a tentação de buscar resultados sem realizar de fato o trabalho. Se estamos investindo para ganhar dinheiro, não gostaríamos de ficar ricos rapidamente, em vez de vagarosamente? Essa mentalidade leva ao uso de informações privilegiadas, de esquemas de pirâmide financeira e ao uso em jogos de azar do dinheiro reservado para o supermercado. Se estamos trabalhando para ser promovidos, não deveríamos usar quaisquer meios disponíveis para nos posicionar melhor aos olhos de nosso supervisor? Isso leva a traições, roubo de crédito, fofocas e desintegração da equipe. Se trabalhamos para atingir uma cota, não poderíamos alcançá-la mais rapidamente com um trabalho de qualidade inferior e repassando os problemas para a pessoa seguinte na cadeia de produção? E não se trata apenas de problemas de moralidade individual. Um sistema de produção que recompensa a má qualidade é tão ruim ou pior do que o trabalhador que tira proveito dele.
Veracidade
“Sobretudo, meus irmãos, não jurem pelo céu, nem pela terra, nem por coisa alguma. Que o ‘sim’ de vocês seja realmente sim, e o ‘não’ seja não, para que não caiam em condenação” (Tg 5.12). Imagine um local de trabalho em que as pessoas sempre digam a verdade — não simplesmente evitando mentir, mas sempre dizendo o que quer que dê ao ouvinte a compreensão mais precisa de como as coisas realmente são. Não haveria necessidade de juramentos e xingamentos, de esclarecimentos retroativos, de cláusulas contratuais definindo quem recebe o quê em caso de distorções ou fraudes. Imagine se os vendedores sempre fornecessem dados extremamente informativos sobre seus produtos, se os contratos fossem sempre claros para todas as partes e se os chefes sempre dessem crédito preciso a seus subordinados. Imagine se nós sempre déssemos respostas que transmitissem o panorama mais preciso possível, em vez de ocultar sutilmente informações pouco lisonjeiras sobre nosso trabalho. Poderíamos ser bem-sucedidos no atual emprego ou na carreira? Poderíamos ser bem-sucedidos se todos se tornassem extremamente verdadeiros? Precisamos mudar nossa definição de sucesso? [1]
Oração
Tiago volta ao princípio da dependência de Deus em sua discussão sobre a oração. “Há alguém sofrendo entre vocês? Que ele ore”(Tg 5:13). “Se algum de vocês tem falta de sabedoria, peça-a a Deus” (Tg 1.5). Tiago está nos convidando a ser específicos com Deus. “Meu Deus, não sei como lidar com essa falha de produção e preciso de sua ajuda antes de falar com meu chefe”. Deus é capaz de realizar o que precisamos, embora não garanta responder a cada oração exatamente como esperamos. Muitos cristãos parecem estranhamente relutantes em orar sobre questões, situações, pessoas, necessidades, medos e perguntas específicas com que se deparam diariamente no trabalho. Esquecemos a exortação de Tiago de pedir orientação específica e até resultados específicos. Tenha fé, diz Tiago, e Deus nos responderá nas situações reais da vida. “Peça-a a Deus, que a todos dá generosamente sem reprovar ninguém, e lhe será concedida” (Tg 1.5).
Confissão e cura
Tiago nos exorta a confessar mutuamente os pecados, para que sejamos curados (Tg 5.16). As palavras mais interessantes no trabalho são “uns aos outros”. A suposição é que as pessoas pecam umas contra as outras, não apenas contra Deus, e no trabalho esse é certamente o caso. Enfrentamos pressão diária para produzir e agir, e temos tempo limitado para isso; portanto, muitas vezes agimos sem ouvir, marginalizamos aqueles que discordam, competimos de forma injusta, monopolizamos recursos, deixamos uma bagunça para o próximo limpar e descarregamos nossas frustrações nos colegas de trabalho. Ferimos e somos feridos. A única maneira de ser curado é confessar os pecados uns aos outros. Se alguém acabou de minar a promoção de um colega de trabalho por criticar de forma imprecisa seu desempenho, o transgressor precisa confessar isso para quem foi injustiçado, e não apenas para Deus em oração particular. O transgressor pode ter de confessar isso também para o restante do departamento, se quiser de fato reparar o dano.
Qual é a nossa motivação para a confissão e a cura? Para que possamos atender às necessidades dos outros. “Quem traz de volta um pecador do seu caminho errado salvará da morte a vida dessa pessoa” (Tg 5.20; grifo nosso). Salvar alguém da morte é atender a uma necessidade muito profunda! E talvez — já que somos todos pecadores — outra pessoa nos salve da morte, desviando-nos do erro em nossos caminhos.