Bootstrap

Israel no Egito (Êxodo 1.1—13.16)

Comentário Bíblico / Produzido por Projeto Teologia do Trabalho
Pier 89268 620

Os maus tratos de Israel pelos egípcios fornecem o pano de fundo e a motivação para sua redenção. O faraó não permitiu que eles seguissem Moisés até o deserto para adorar ao Senhor e, assim, negou uma medida de sua liberdade religiosa. Mas sua opressão como trabalhadores do sistema econômico egípcio é o que realmente chama nossa atenção. Deus ouve o clamor de seu povo e faz algo a respeito. Mas devemos lembrar que o povo de Israel não geme por causa do trabalho em geral, mas por causa da dureza de seu trabalho. Em resposta, Deus não os entrega a uma vida de descanso total, mas a uma libertação do trabalho opressivo.

A dureza do trabalho escravo dos israelitas no Egito (Êxodo 1.8-14)

Voltar ao índice Voltar ao índice

O trabalho que os egípcios impuseram aos israelitas era de motivação maligna e de natureza cruel. A cena de abertura apresenta a terra cheia de israelitas que foram frutíferos e se multiplicaram. Isso ecoa a intenção criacional de Deus (Gn 1.28; 9.1), bem como sua promessa a Abraão e seus descendentes escolhidos (Gn 17.6; 35.11; 47.27). Como nação, eles estavam destinados a abençoar o mundo. Sob um governo anterior, os israelitas tinham permissão real para viver na terra e trabalhar nela. Mas agora, o novo rei do Egito sentiu que aquele grande povo representava uma ameaça à sua segurança nacional e, portanto, decidiu lidar com eles “com astúcia” (Êx 1.10). Não nos é dito se os israelitas eram ou não uma ameaça genuína. A ênfase recai sobre o medo destrutivo do faraó, que o levou primeiro a degradar seu ambiente de trabalho e, depois, a usar o infanticídio para conter o crescimento da população.

O trabalho pode ser física e mentalmente desgastante, mas isso não o torna errado. O que tornou a situação no Egito insuportável não foi apenas a escravidão, mas também sua extrema dureza. Os mestres egípcios tratavam os israelitas de forma “cruel” (befarekh, Êx 1.13,14) e tornaram a vida deles “amarga” (marar, Êx 1.14) com serviço “árduo” (qasheh, no sentido de “cruel”, Êx. 1.14; 6.9). Como resultado, Israel definhou em “opressão” e “sofrimento” (Êx 3.7) e em “angústia” (Êx 6.9). O trabalho, um dos principais propósitos e alegrias da existência humana (Gn 1.27-31; 2.15), foi transformado em miséria pela dureza da opressão.

O trabalho de parteira e da maternidade (Êxodo 1.15—2.10)

Voltar ao índice Voltar ao índice

Em meio ao tratamento severo, os israelitas permaneceram fiéis à ordem de Deus de serem frutíferos e se multiplicarem (Gn 1.28). Isso envolvia ter filhos, o que, por sua vez, dependia do trabalho das parteiras. Além de sua presença na Bíblia, o trabalho de parteiras é bem atestado na antiga Mesopotâmia e no Egito. As parteiras ajudavam as mulheres a dar à luz, cortavam o cordão umbilical do bebê, lavavam o bebê e apresentavam a criança à mãe e ao pai.

As parteiras nesta narrativa possuem um temor de Deus que as levou a desobedecer à ordem real de matar todos os meninos nascidos das mulheres hebreias (Êx 1.15-17). De um modo geral, o “temor do Senhor” (e expressões relacionadas) na Bíblia se refere a um relacionamento saudável e obediente com o Deus de Israel (hebraico, YHWH), que faz alianças. Seu “temor a Deus” era mais forte do que qualquer medo que o faraó do Egito pudesse submetê-los. Além disso, talvez sua coragem tenha surgido de seu trabalho. Será que aquelas que pastoreiam uma nova vida todos os dias passam a valorizar tanto a vida que o assassinato se tornaria impensável, mesmo se ordenado por um rei?

A mãe de Moisés, Joquebede (Êx 6.20), foi outra mulher que enfrentou uma escolha aparentemente impossível e forjou uma solução criativa. Dificilmente se pode imaginar seu alívio por ter um filho homem em segredo e com sucesso, seguido por sua dor por ter de colocá-lo no rio — e isso de uma maneira que realmente pudesse salvar sua vida. Os paralelos com a arca de Noé — a palavra hebraica para “cesto” é usada apenas em outro lugar na Bíblia, a saber, para a “arca” de Noé — nos permitem saber que Deus estava agindo não apenas para salvar um menino, ou mesmo uma nação, mas também para redimir toda a criação por meio de Moisés e Israel. Paralelamente à sua recompensa para com as parteiras, Deus mostrou bondade para com a mãe de Moisés. Ela recuperou o filho e cuidou dele até que ele tivesse idade suficiente para ser adotado como filho da filha do faraó. O trabalho piedoso de gerar e criar filhos é bem conhecido por ser complexo, exigente e louvável (Pv 31.10-31). Em Êxodo, não lemos nada sobre as lutas internas vividas por Joquebede, a heroína desconhecida. Do ponto de vista narrativo, a vida de Moisés é a questão principal. Mas a Bíblia mais tarde elogiou Joquebede e Anrão, pai de Moisés, pela maneira como eles colocaram sua fé em ação (Hb 11.23).

Com muita frequência, o trabalho de dar à luz e criar filhos é negligenciado. As mães, especialmente, muitas vezes entendem que criar os filhos não é tão importante ou louvável quanto qualquer outro trabalho. No entanto, quando Êxodo conta a história de como seguir a Deus, a primeira coisa que ele tem a nos dizer é a incomparável importância de gerar, criar, proteger e ajudar os filhos. O primeiro ato de coragem, neste livro repleto de feitos corajosos, é a coragem de uma mãe, de sua família e de suas parteiras ao salvar seu filho.

O chamado de Deus a Moisés (Êxodo 2.11—3.22)

Voltar ao índice Voltar ao índice

Embora Moisés fosse hebreu, ele foi criado na família real do Egito como neto do faraó. Sua repulsa à injustiça explodiu em um ataque letal a um egípcio que ele encontrou espancando um trabalhador hebreu. Esse ato chamou a atenção do faraó, por isso Moisés fugiu em busca de segurança e tornou-se pastor em Midiã, uma região a várias centenas de quilômetros a leste do Egito, do outro lado da península do Sinai. Não sabemos exatamente quanto tempo ele viveu lá, mas durante esse tempo ele se casou e teve um filho. Além disso, duas coisas importantes aconteceram. O rei do Egito morreu, e o Senhor ouviu o clamor de seu povo oprimido e se lembrou de sua aliança com Abraão, Isaque e Jacó (Êx 2.23-25). Esse ato de lembrar não significava que Deus havia se esquecido de seu povo. Sinalizou que ele estava prestes a agir em nome deles. [1] Para isso, ele chamaria Moisés.

O chamado de Deus a Moisés veio enquanto Moisés estava trabalhando. O relato de como isso aconteceu compreende seis elementos que formam um padrão evidente na vida de outros líderes e profetas na Bíblia. Portanto, é instrutivo examinar essa narrativa de chamado e considerar suas implicações para nós hoje, especialmente no contexto de nosso trabalho.

Primeiro, Deus confrontou Moisés e chamou sua atenção na cena da sarça em chamas (Êx 3.2-5). Um arbusto em chamas no semideserto não é nada de excepcional, mas Moisés ficou intrigado com a natureza daquele fogo em particular. Moisés ouviu seu nome ser chamado e respondeu: “Eis-me aqui”. (Êx 3.4). Esta é uma declaração de disponibilidade, não de localização. Em segundo lugar, o Senhor apresentou-se como o Deus dos patriarcas e comunicou sua intenção de resgatar seu povo do Egito e trazê-los para a terra que ele havia prometido a Abraão (Êx 3.6-9). Terceiro, Deus comissionou Moisés para ir ao faraó a fim de tirar o povo de Deus do Egito (Êx 3.10). Quarto, Moisés argumentou (Êx 3.11). Embora ele tivesse acabado de ouvir uma poderosa revelação sobre quem estava falando com ele naquele momento, sua preocupação imediata foi: “Quem sou eu?”. Em resposta a isso, Deus tranquilizou Moisés com a promessa de sua própria presença (Êx 3.12a). Finalmente, Deus falou de um sinal de confirmação (Êx 3.12b).

Esses mesmos elementos estão presentes em várias outras narrativas de chamados nas Escrituras — por exemplo, nos chamados de Gideão, Isaías, Jeremias, Ezequiel e alguns dos discípulos de Jesus. Essa não é uma fórmula rígida, pois muitas outras narrativas de chamados nas Escrituras seguem um padrão diferente. Mas sugere que o chamado de Deus geralmente vem por meio de uma série extensa de encontros que guiam uma pessoa no caminho de Deus ao longo do tempo.

O
juiz
Gideão

O
profeta
Isaías

O
profeta
Jeremias

O
profeta
Ezequiel

Discípulos
de Jesus
em Mateus

Confronto

6.11b-12a

6.1-2

1.4

1.1-28a

28.16-17

Introdução

6.12b-13

6.3-7

1.5a

1.28b—2.2

28.18

Comissionamento

6.14

6.8-10

1.5b

2.3-5

28.19-20a

Argumentação

6.15

6.11a

1.6

2.6,8

Garantia

6.16

6.11b-13

1.7-8

2.6-7

28.20b

Sinal de confirmação

6.17-21


1.9-10

2.9—3.2

Possivelmente o
livro de Atos

Observe que esses chamados não são principalmente para o trabalho sacerdotal ou religioso em uma congregação. Gideão era um líder militar; Isaías, Jeremias e Ezequiel eram críticos sociais; e Jesus era um rei (embora não no sentido tradicional). Em muitas igrejas hoje, o termo “chamado” é limitado a ocupações religiosas, mas isso não é verdade nas Escrituras e, certamente, não em Êxodo. O próprio Moisés não era um sacerdote ou líder religioso (esses eram os papéis de Arão e Miriã), mas um pastor, estadista e governador. A pergunta do Senhor a Moisés: “O que é isso em sua mão?” (Êx 4.2) redireciona a ferramenta comum de pastoreio de ovelhas usada por Moisés para usos que ele nunca imaginou serem possíveis (Êx 4.3-5).

A obra de redenção de Deus para Israel (Êxodo 5.1—6.28)

Voltar ao índice Voltar ao índice

No livro de Êxodo, Deus é o obreiro essencial. A natureza e a intenção dessa obra divina definiram a agenda da obra de Moisés e, por meio dele, da obra do povo de Deus. O chamado inicial de Deus a Moisés incluía uma explicação da obra de Deus. Isso levou Moisés a falar em nome do Senhor a faraó, dizendo: “Deixe o meu povo ir” (Êx 5.1). A refutação do faraó não foi meramente verbal; ele oprimiu os israelitas com mais severidade do que antes. No final deste episódio, até os próprios israelitas se voltaram contra Moisés (Êx 5.20-21). É nesse ponto crucial que, em resposta ao questionamento de Moisés a Deus sobre todo o empreendimento, Deus esclareceu o projeto de sua obra. O que lemos aqui em Êxodo 6.2-8 não pertence apenas ao contexto imediato da opressão de Israel no Egito, mas estrutura uma agenda que abrange toda a obra de Deus na Bíblia. [1] É importante que todos os cristãos tenham clareza sobre o escopo da obra de Deus, porque isso nos ajuda a entender o que significa orar para que o Reino de Deus venha e para que sua vontade seja feita assim na terra como no céu (Mt 6.10). O cumprimento dessas intenções é tarefa de Deus. Para realizá-las, ele envolverá todo o seu povo, não apenas aqueles que fazem trabalho “religioso”. Chegar a uma compreensão mais clara da obra de Deus nos capacita a considerar melhor não apenas a natureza de nossa obra, mas a maneira pela qual Deus deseja que a façamos.

Para melhor apreciar esse texto-chave, faremos algumas breves observações sobre ele e, em seguida, mostraremos como ele é relevante para a teologia do trabalho. Depois de uma resposta inicialmente segura à pergunta acusatória de Moisés sobre a missão de Deus (Êx 5.22—6.1), Deus molda sua resposta mais extensa com as palavras “Eu sou o Senhor” no início e no fim (Êx 6.2,8). Essa frase-chave demarca o parágrafo e dá ao conteúdo uma prioridade especialmente alta. Os leitores devem ter o cuidado de observar que essa frase não comunica o que Deus é em termos de um título. Ela revela o próprio nome de Deus e, portanto, fala quem ele é. [2] Ele é o Deus que apareceu aos patriarcas, que faz alianças e cumpre promessas. A obra que Deus está prestes a fazer por seu povo está, portanto, fundamentada nas intenções que Deus expressou a eles. A saber, estes devem multiplicar os descendentes de Abraão, engrandecer seu nome e abençoá-lo para que, por meio de Abraão, Deus abençoe todas as famílias da terra (Gn 12.2-3).

A obra de Deus aparece então em quatro partes. Esses quatro propósitos redentores de Deus reaparecem de várias maneiras ao longo do Antigo Testamento e até dão forma ao clímax da obra redentora de Deus em Jesus Cristo. A primeira é a obra de libertação. “Eu os livrarei do trabalho imposto pelos egípcios. Eu os libertarei da escravidão e os resgatarei com braço forte e com poderosos atos de juízo” (Êx 6.6). Inerente a esse trabalho de libertação está a verdade franca de que o mundo é um lugar de opressão múltipla. Às vezes, usamos a palavra salvação para descrever essa atividade de Deus, mas devemos ter cuidado para evitar entendê-la em termos de resgate da terra para o céu (e certamente não da matéria para o espírito) ou como mero perdão de pecados. O Deus de Israel libertou seu povo entrando em seu mundo e efetuando uma mudança “no terreno”, por assim dizer. Êxodo não apenas mostra Deus efetuando a libertação de Israel do faraó no Egito, mas também prepara o terreno para o rei messiânico, Jesus, libertar seu povo de seus pecados e vencer o diabo, o tirano do mal (Mt 1.21; 12.28).

Segundo, o Senhor formará uma comunidade piedosa. “Eu os farei meu povo e serei o Deus de vocês” (Êx 6.7a). Deus não libertou seu povo para que eles pudessem viver como quisessem, nem os libertou como indivíduos isolados. Ele pretendia criar um tipo qualitativamente diferente de comunidade, na qual seu povo viveria com ele e uns com os outros em fidelidade à aliança. Toda nação nos tempos antigos tinha seus “deuses”, mas a identidade de Israel como povo de Deus envolvia um estilo de vida de obediência a todos os decretos, mandamentos e leis de Deus (Dt 26.17-18). À medida que esses valores e ações impregnassem seu modo de lidar com Deus e uns com os outros (e mesmo aqueles fora da aliança), Israel demonstraria cada vez mais o que genuinamente significa ser o povo de Deus. Novamente, isso forma o pano de fundo para Jesus, que construiria sua “igreja”, não como uma estrutura física de tijolo ou pedra, mas como uma nova comunidade com discípulos de todas as nações (Mt 16.18; 28.19).

Terceiro, o Senhor criará um relacionamento contínuo entre ele e seu povo. “Então vocês saberão que eu sou o Senhor, o seu Deus, que os livra do trabalho imposto pelos egípcios” (Êx 6.7b). Todas as outras declarações do propósito de Deus começam com a palavra eu, exceto esta. Aqui, o foco está em vocês. Deus deseja que seu povo tenha uma certa experiência de seu relacionamento com Deus, que graciosamente os resgatou. Para nós, o conhecimento parece praticamente equivalente à informação. O conceito bíblico de conhecimento abraça essa noção, mas também inclui a experiência interpessoal de conhecer os outros. Dizer que Deus não se fez “conhecido” como “Senhor” a Abraão não significa que Abraão desconhecia o nome divino “YHWH” (Gn 13.4; 21.33). Significa que Abraão e sua família ainda não haviam experimentado pessoalmente o significado desse nome como descritivo de seu Deus cumpridor de promessas, que lutaria em nome de seu povo para livrá-lo da escravidão em escala nacional. [3] Em última análise, isso é retomado por Jesus, cujo nome “Emanuel” significa Deus “conosco” em relacionamento (Mt 1.23).

Quarto, Deus pretende que seu povo experimente a boa vida. “E os farei entrar na terra que, com mão levantada, jurei que daria a Abraão, a Isaque e a Jacó” (Êx 6.8). Deus prometeu dar a Abraão a terra de Canaã, mas não é correto simplesmente equiparar essa “terra” ao nosso conceito de “região”. É uma terra de promessa e provisão. A descrição regular e positiva dela como terra “onde manam leite e mel” (Êx 3.8) destaca sua natureza simbólica como um lugar para viver com Deus e o povo de Deus em condições ideais, algo que entendemos como a “vida em abundância”. [4] Aqui, novamente, vemos que a obra de salvação de Deus é um ajuste correto de toda a sua criação — ambiente físico, pessoas, cultura, economia, tudo. Essa também é a missão de Jesus quando ele inicia o Reino de Deus vindo à terra, onde os mansos herdarão a terra e experimentarão a vida eterna (Mt 5.5; Jo 17.3). [9] Isso se completa na Nova Jerusalém de Apocalipse 21 e 22. Êxodo, portanto, estabelece o caminho para toda a Bíblia que se segue.

Considere como nosso trabalho hoje pode expressar esses quatro propósitos redentores. Primeiro, a vontade de Deus é livrar pessoas da opressão e das condições prejudiciais da vida. Parte desse trabalho resgata pessoas de perigos físicos; outro trabalho se concentra no alívio de traumas psicológicos e emocionais. O trabalho de cura toca as pessoas uma a uma; aqueles que elaboram soluções políticas para nossas necessidades podem abençoar sociedades e classes de pessoas inteiras. Os que trabalham na aplicação da lei e no sistema judicial devem ter como objetivo restringir e punir aqueles que fazem o mal, proteger as pessoas e cuidar das vítimas. Dada a extensão generalizada da opressão no mundo, sempre haverá múltiplas oportunidades e meios de trabalhar pela libertação.

O segundo e o terceiro propósitos (comunidade e relacionamento) estão intimamente relacionados entre si. O trabalho piedoso que promove a paz e a verdadeira harmonia no céu aumentará a misericórdia e a justiça na terra. Esta é a essência do discurso de Paulo aos coríntios: por meio de Cristo, Deus nos reconciliou consigo mesmo e, assim, nos deu a mensagem e o ministério da reconciliação (2Co 5.16-20). Os cristãos experimentaram essa reconciliação e, portanto, têm motivos e meios para fazer esse tipo de trabalho. O trabalho de evangelismo e desenvolvimento espiritual honra uma dimensão da área; o trabalho de paz e justiça honra a dimensão interpessoal. Em essência, os dois são inseparáveis ​​e aqueles que trabalham nesses campos fazem bem em lembrar a natureza holística do que Deus está fazendo. Jesus ensinou que, porque nós somos a luz do mundo, devemos deixar nossa luz brilhar diante dos outros (Mt 5.14-16).

Construir comunidade e relacionamentos pode ser o objeto do nosso trabalho, como no caso de líderes comunitários, pessoas que trabalham com jovens, assistentes sociais, organizadores de eventos, profissionais de mídia social, pais e familiares e muitos outros. Mas estes também podem ser elementos do nosso trabalho, seja qual for a nossa ocupação. Quando damos boas-vindas e ajudamos novos trabalhadores, perguntamos e ouvimos os outros falarem sobre assuntos importantes, estamos dispostos a conhecer alguém pessoalmente, enviamos uma nota de encorajamento, compartilhamos uma foto memorável, levamos boa comida para compartilhar, incluímos alguém em uma conversa ou uma infinidade de outros atos de camaradagem, estamos cumprindo esses dois propósitos do trabalho, dia após dia.

Finalmente, o trabalho piedoso promove a boa vida. Deus guiou seu povo para fora do Egito, a fim de fazê-los entrar na terra prometida, onde eles poderiam se estabelecer, viver e se desenvolver. No entanto, o que Israel experimentou lá foi muito menos do que o ideal de Deus. Da mesma forma, o que os cristãos experimentam no mundo também não é o ideal. A promessa de entrar no descanso de Deus ainda está em aberto (Hb 4.1). Ainda esperamos por um novo céu e uma nova terra. Mas muitas das leis da aliança que Deus deu por meio de Moisés têm a ver com o tratamento ético mútuo. É vital, então, que a bênção de Deus seja operada na maneira como vivemos e trabalhamos uns com os outros. Visto do lado negativo, como podemos razoavelmente esperar que todas as famílias da terra experimentem a bênção de Deus por meio de nós (o povo de Abraão, por meio da fé em Cristo), se nós mesmos ignoramos as instruções de Deus sobre como viver e fazer nosso trabalho? Como Christopher Wright observou: “O povo de Deus, em ambos os testamentos, é chamado para ser uma luz para as nações. Mas não pode haver luz para as nações se ela já não estiver brilhando na vida transformada de um povo santo”. [5] Assim, fica claro que o tipo de “vida boa” em vista aqui não tem nada a ver com uma prosperidade egoísta ou um consumo desenfreado, pois abrange o amplo espectro da vida como Deus espera que seja: cheia de amor, justiça e misericórdia.

Moisés e Arão anunciam o julgamento de Deus ao faraó (Êxodo 7.1—12.51)

Voltar ao índice Voltar ao índice

Deus começou o primeiro passo — libertação — enviando Moisés e Aarão para dizer ao faraó que deixasse “os israelitas saírem do país” (Êx 7.2). Para essa tarefa, Deus fez uso da habilidade natural de Arão em falar em público (Êx 4.14; 7.1). Ele também equipou Arão com habilidade que supera a dos altos oficiais do Egito (Êx 7.10-12). Isso nos lembra que a missão de Deus requer palavra e ação.

O faraó se recusou a ouvir a ordem de Deus, por meio de Moisés, de libertar Israel da escravidão. Por sua vez, Moisés anunciou o juízo de Deus ao faraó por meio de uma série cada vez mais severa de desastres ecológicos (Êx 7.17—10.29). Esses desastres causaram miséria pessoal. Mais significativamente, eles prejudicaram drasticamente a capacidade produtiva da terra e do povo do Egito. As doenças causaram a morte do gado (Êx 9.6). As colheitas falharam e as florestas foram arruinadas (Êx 9.25). As pragas invadiram vários ecossistemas (Êx 8.6,24; 10.13-15). Em Êxodo, o desastre ecológico é a retribuição de Deus contra a tirania e a opressão do faraó. No mundo moderno, a opressão política e econômica é um fator importante na degradação ambiental e no desastre ecológico. Seríamos tolos em pensar que podemos assumir a autoridade de Moisés e declarar o julgamento de Deus em qualquer uma dessas coisas. Mas podemos ver que, assim como a economia, a política, a cultura e a sociedade precisam de redenção, o meio ambiente também precisa.

Cada uma dessas ações de advertência convenceu o faraó a libertar Israel, mas, à medida que cada uma delas passava, ele voltava atrás. Finalmente, Deus trouxe o desastre de matar todos os primogênitos entre o povo e os animais dos egípcios (Êx 12.29-30). O efeito terrível da escravidão é “endurecer” o coração contra a compaixão, a justiça e até a autopreservação, como o faraó logo descobriu (Êx 11.10). O faraó então aceitou a exigência de Deus de libertar Israel. Os israelitas que partiram “saquearam” as joias, a prata, o ouro e as roupas dos egípcios (Êx 12.35-36). Isso reverteu os efeitos da escravidão, que era a pilhagem legalizada de trabalhadores explorados. Quando Deus liberta as pessoas, ele restaura seu direito de trabalhar por frutos que elas mesmas possam usufruir (Is 65.21-22). O trabalho — e as condições em que ele é realizado — é assunto da maior preocupação de Deus.