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Os sucessos e fracassos de Davi como rei (2Samuel 1—24)

Comentário Bíblico / Produzido por Projeto Teologia do Trabalho
Michelangelos david 620

A Bíblia considera Davi o modelo de rei de Israel, e os livros de Samuel, Reis e Crônicas descrevem seus muitos sucessos. No entanto, mesmo Davi, um homem segundo o coração de Deus (1Sm 13.14), abusa de seu poder e às vezes age sem fé. Ele tende a ter sucesso quando não se leva muito a sério, mas entra em sérios problemas quando o poder sobe à sua cabeça — por exemplo, quando resolve fazer um censo, violando o mandamento de Deus (2Sm 24.10-17) ou quando explora sexualmente Bate-Seba e ordena o assassinato de seu marido, Urias (2Sm 11.2-17). No entanto, apesar das falhas de Davi, Deus cumpre sua aliança com ele e o trata com misericórdia.

O estupro de Bate-Seba e o assassinato de Urias por Davi (2Samuel 11—12)

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Pessoas no poder têm encoberto casos de abuso sexual há milênios, mas a Bíblia expõe corajosamente exemplos de abuso contra Sara, Hagar, Diná, Tamar (duas delas) e Bate-Seba, o assunto desta passagem. O abuso de Bate-Seba parece o mais chocante de todos, porque ocorre nas mãos de ninguém menos que o ancestral mais famoso de Jesus, o rei Davi. A história é antiga, mas a questão permanece tão atual quanto sempre. Nos últimos anos, uma onda de histórias de abuso sexual gerou o movimento #metoo que derrubou grandes nomes do entretenimento (Harvey Weinstein, Bill O'Reilly, Charlie Rose), da política (Al Franken, Patrick Meehan, John Conyers), dos negócios (Steve Wynn, Travis Kalanick), esportes (Larry Nassar), música (R. Kelly) e religião (Bill Hybels, Andy Savage, Paige Patterson). Todos esses nomes são dos EUA, mas o problema é mundial.

A história é conhecida. Do telhado, Davi percebe que sua atraente vizinha, Bate-Seba, está tomando banho. Ele envia seus homens para levá-la até ele no palácio, faz sexo com ela e ela fica grávida. Em uma tentativa de encobrir a gravidez, Davi chama Urias, marido de Bate-Seba, que estava lutando em Rabá, mas Urias tem integridade demais para dormir com sua esposa enquanto o restante do exército e a arca estão acampados em tendas. Depois que Davi orquestra a morte de Urias em batalha, ele assume que o desastre foi evitado. Mas Davi não leva Deus em consideração.

Ao longo da história, esse encontro entre Davi e Bate-Seba foi frequentemente descrito como adultério, o que implica consentimento mútuo. No entanto, ao examinarmos os detalhes, vemos que, na verdade, trata-se de abuso sexual por alguém com poder, em outras palavras, estupro. Nem o texto nem o contexto apoiam a conclusão de que foi um caso consensual entre dois adultos. As pessoas que pensam que Bate-Seba seduziu Davi tomando banho do lado de fora de sua janela podem não perceber que o verbo hebraico rachats, usado para a ação de Bate-Seba aqui (2Sm 11.2), significa literalmente “lavar”, e assim é traduzido em outras partes desta narrativa (2Sm 11.8; 12.20). Não há razão para supor que Bate-Seba estava nua, ou que ela estava ciente de que o rei, que deveria estar com seu exército, estaria espiando de seu telhado (2Sm 11.1-2).

As pessoas que pensam que ela concordou em ir ao palácio de bom grado não entendem que, quando um antigo governante convocava um súdito ao palácio, o súdito não tinha escolha a não ser obedecer (veja Et 2.14, 3.12 e 8.9, por exemplo). E Davi envia não um, mas vários mensageiros, para garantir a obediência de Bate-Seba (2Sm 11.4). Lembre-se, a única pessoa que se recusa a seguir as diretrizes de Davi nesta história é Urias, e ele acaba morto (2Sm 11.14-18). O texto não diz que Bate-Seba percebeu que estava sendo trazida ao palácio para fazer sexo com o rei. É até mais provável que ela tivesse presumido que a convocação era para ser informada da morte de seu marido, o que foi essencialmente o que aconteceu mais tarde (2Sm 11.26-27).

O texto declara a ação como uma perpetração unilateral de Davi. “Davi mandou que a trouxessem, e se deitou com ela”, não “eles se deitaram juntos” (2Sm 11.4). A linguagem usada aqui para descrever o encontro sugere estupro, não adultério. Davi “mandou trazer” (laqach, lit. “tomou”) Bate-Seba e “deitou” (shakav) com ela. O verbo shakav pode significar apenas relação sexual, mas é usado na maioria dos incidentes de estupro na Bíblia hebraica. Os verbos laqach e shakav só aparecem juntos em contextos de estupro (Gn 34.2; 2Sm 12.11; 16.22).

Não podemos culpar Bate-Seba por consentir quando levada à câmara de um homem que possuía grande poder e um histórico de violência. À medida que a narrativa continua, todas as pessoas censuram Davi, mas ninguém censura Bate-Seba. Deus culpa Davi. “O que Davi fez desagradou ao Senhor” (2Sm 11.27). O profeta Natã acusa Davi, contando uma parábola na qual um homem rico (representando Davi) “toma” uma ovelha preciosa (Bate-Seba) de um homem pobre (Urias). Depois de ouvir a parábola de Natã, até Davi o culpa. “O homem que fez isso merece a morte!” (2Sm 12.5). Caso ainda não tenha ficado claro, Natã responde: “Você é esse homem!” (2Sm 12.7). De acordo com as leis de estupro e adultério de Deuteronômio 22.22-29, se o homem merece morrer, o que aconteceu não foi adultério, mas estupro.

Quando chamamos esse incidente de adultério ou contestamos as ações de Bate-Seba, não estamos apenas ignorando o texto, mas essencialmente culpando a vítima. No entanto, quando chamamos isso de estupro e nos concentramos nas ações de Davi, não apenas levamos o texto a sério, mas validamos as histórias de outras vítimas de abuso sexual. Assim como Deus viu o que Davi fez com Bate-Seba, Deus vê o que os perpetradores fazem com as vítimas de abuso sexual hoje.

O crime de Davi foi um abuso de poder realizado na forma de violação sexual. Como soberano sobre o maior império de Israel, Davi tinha indiscutivelmente mais poder do que qualquer outro israelita no Antigo Testamento. Antes de Davi assumir o trono, ele usou seu poder para servir aos outros, talvez mais notavelmente às cidades indefesas de Queila e Ziclague (1Sm 23.1-14; 30.1-31). Já no caso de Bate-Seba, ele abusou de seu poder primeiro para servir sua própria luxúria e, em seguida, para preservar sua reputação.

Embora poucos de nós tenham tanta autoridade quanto Davi, muitos de nós têm poder em esferas menores em contextos familiares ou de trabalho, seja como resultado de nosso sexo, raça, posição, riqueza ou outros marcadores de status, ou simplesmente à medida que envelhecemos, ganhamos experiência e temos mais responsabilidade. É tentador tirar proveito de nosso poder e privilégio, pensando que trabalhamos duro por essas vantagens (melhores escritórios, vagas especiais de estacionamento, salários mais altos), mesmo que pessoas com menos poder não as compartilhem.

Por outro lado, muitos de nós somos vulneráveis ​​aos que estão no poder pelas mesmas razões, embora estejam do lado oposto da distribuição de poder. Pode ser tentador pensar que aqueles em posições vulneráveis ​​​​devam tentar se defender, como muitos pensaram em relação a Bate-Seba. O texto não apresenta nenhuma evidência de que ela tenha tentado recusar a imposição sexual de Davi, portanto — segundo esse tipo de pensamento — ela deve ter participado voluntariamente. Como vimos, a Bíblia rejeita esse tipo de pensamento. A vítima de um crime é sempre a vítima do crime, não importa quanta ou pouca resistência ela possa ter oferecido.

Davi mergulhou nesse crime depois de ter esquecido que foi Deus quem lhe deu sua posição de poder e que Deus se importava com o que ele fazia com ela. Os pastores deveriam cuidar das ovelhas de seu rebanho, e não devorá-las (Ez 34). Jesus, o bom pastor, usou seu poder para alimentar, servir, curar e abençoar as pessoas sob sua autoridade, e ordenou que seus seguidores fizessem o mesmo (Mc 9.35; 10.42-45).

O poder soberano de Davi permitiu que ele evitasse aspectos desagradáveis ​​de sua responsabilidade, especificamente liderando seu exército na guerra, mesmo sendo um herói militar, derrotando Golias e “milhares” em batalha (1Sm 17; 18.7; 21.11; 29.5).Uma consequência de sua decisão de ficar em casa e tirar um cochilo foi que ele tinha pouca responsabilidade, já que seus amigos mais próximos (seus “homens poderosos”) estavam lutando. Muitas pessoas sabiam o que Davi estava fazendo, mas eles eram servos e, o que não é de surpreender, nenhum deles se manifestou. As pessoas que enfrentam o poder normalmente pagam por isso.

Mas isso não impediu Abigail, a sábia esposa do tolo Nabal, de se colocar em perigo para impedir que Davi, que ainda não era o governante, iniciasse um ataque sangrento (1Sm 25). Se um dos servos de Davi tivesse proferido uma palavra de advertência cedo, como Abigail fez, talvez o estupro de Bate-Seba e o assassinato de Urias pudessem ter sido evitados. Depois que os crimes foram cometidos, o profeta Natã foi inspirado por Deus a confrontar o rei, que, felizmente para sua alma, foi receptivo à mensagem (2Sm 12). Observe que tanto Abigail quanto Natã não eram propriamente os alvos dos abusos de poder de Davi. Eles estavam em posições de poder inferior ao do agressor, mas de alguma forma reconheciam que poderiam intervir e estavam dispostos a correr o risco de fazê-lo. Será que suas ações sugerem que aqueles de nós que estão cientes do abuso têm a responsabilidade de preveni-lo ou denunciá-lo, mesmo que isso represente um risco para nós ou para nossa reputação?

A maioria de nós não está em situações em que confrontar um chefe ou supervisor envolve arriscar a vida, mas falar nesses tipos de contexto pode significar perder status, uma promoção ou até o emprego. Mas, como esta e muitas outras histórias semelhantes nas Escrituras ilustram, Deus chama seu povo para agir como profetas em nossas igrejas, escolas, empresas e onde quer que trabalhemos e vivamos. Os exemplos de Abigail e Natã — além das instruções de Jesus em Mateus 18.15-17 — sugerem que, idealmente, devemos falar cara a cara com o agressor. (No entanto, Romanos 13.1-7 implica que os cristãos podem usar outros meios do devido processo legal que não exijam confronto individual com o agressor.)

Para aqueles de nós que evitam conflitos, aprender a falar a verdade para pessoas em posição de autoridade é algo que pode ser desenvolvido gradualmente ao longo do tempo, como fazer fisioterapia para um músculo fraco ou lesionado. Cultivamos a capacidade de confrontar começando com pequenos passos, fazendo perguntas ou apontando pequenos problemas. Podemos, então, passar para questões mais significativas, oferecendo diferentes perspectivas que podem não ser populares. Com o tempo, podemos nos tornar mais corajosos, de modo que, se estivermos cientes de uma falha moral significativa, como o abuso sexual cometido por um colega ou um superior, possamos falar a verdade de maneira sábia e graciosa. Do outro lado da equação, líderes sábios permitem com mais facilidade que seus subordinados os responsabilizem e levantem questões. Quando você atua como líder, o que faz para receber ou solicitar feedback negativo dos outros?

Davi aceita o severo feedback negativo de Natã e se arrepende. Mesmo assim, Natã aponta para Davi que seu arrependimento e perdão individuais não põem fim, por si só, às consequências que o pecado de Davi terá sobre os outros:

Então Davi disse a Natã: “Pequei contra o Senhor!”
E Natã respondeu: “O Senhor perdoou o seu pecado. Você não morrerá. Entretanto, uma vez que você insultou o Senhor, o menino morrerá”. (2Sm 12.13-14).

Mesmo pessoalmente arrependido, Davi não erradica a cultura de exploração que vigorava sob sua liderança. Natã declara a Davi que a punição por seu pecado será severa, e o restante do reinado de Davi é marcado por turbulências (2Sm 13—21, 1Rs 1). De fato, o filho de Davi, Amnom, comete o mesmo crime (estupro), mas de uma maneira ainda mais repreensível, pois é contra sua própria irmã Tamar (2Sm 13.1-19). O próprio Davi é cúmplice, embora talvez sem saber. Mesmo quando o assunto é trazido à sua atenção, Davi não faz nada para trazer justiça à situação. Finalmente, outro filho de Davi, Absalão, decide agir por conta própria. Ele mata Amnom e inicia uma guerra dentro da própria casa de Davi (2Sm 13), que se transforma em guerra civil e uma sequência de tragédias em todo o Israel.

Uma cultura que tolera o abuso é muito difícil de ser erradicada, muito mais difícil do que seus líderes supõem. Se Davi achava que seu arrependimento pessoal seria suficiente para restaurar a integridade de sua família, estava tragicamente enganado. Infelizmente, esse tipo de complacência e desrespeito voluntário em tolerar uma cultura de abuso continua até os dias atuais. Quantas igrejas, corporações, universidades, governos e organizações prometeram erradicar uma cultura de abuso sexual depois que um incidente for exposto, apenas para voltar imediatamente aos mesmos velhos hábitos e perpetrar ainda mais abusos?

Este episódio não termina em desespero, no entanto. O abuso sexual é um dos pecados mais graves, mas, mesmo assim, há esperança de justiça e restauração. Será que é possível deixar que os exemplos de Davi, Natã e Bate-Seba nos encorajem a admitir e nos arrepender (se formos os autores), a confrontar (se estivermos cientes do crime) ou a nos recuperar (se formos a vítima)? Em qualquer caso, o primeiro passo é fazer que o abuso cesse. Somente quando isso ocorre é que podemos falar de arrependimento, incluindo aceitação da culpa, punição e, se possível, restituição. Ao mencionar a linhagem de Jesus — o descendente mais famoso de Davi —, Mateus nos lembra do estupro de Davi. Mateus inclui Bate-Seba entre as quatro mães que ele menciona, não a chamando de esposa de Davi, mas de “mulher de Urias”, o homem que Davi assassinou (Mt 1.6). Esse aviso, no início dos Evangelhos, nos lembra que Deus é um Deus tanto de justiça quanto de restauração. Nessa faceta única, podemos de fato ver Davi como um modelo que vale a pena imitar. Esse homem de poder, quando confrontado com evidências de seus próprios erros, se arrepende e clama por justiça, mesmo sabendo que isso pode levar à sua ruína. Ele recebe misericórdia, mas não por seu próprio poder nem pelo poder de seus comparsas, mas por se submeter a uma autoridade que está além de seu poder de manipulação.

O tratamento disfuncional de Davi com os conflitos familiares leva à guerra civil (2Samuel 13—19)

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A maioria das pessoas se sente desconfortável em situações de conflito, por isso tendemos a evitar conflitos, seja em casa ou no trabalho. Mas os conflitos são muito parecidos com doenças. Os menores podem desaparecer, mesmo que os ignoremos, mas os maiores penetrarão mais profundamente e de forma mais catastrófica em nossos sistemas, se não os tratarmos. Isso é verdade para a família de Davi. Davi permite que o conflito entre alguns de seus filhos mergulhe sua família na tragédia. Seu filho mais velho, Amnom, estupra e depois envergonha sua meia-irmã, Tamar (2Sm 13.1-19). O irmão de Tamar, Absalão, odeia Amnom por esse crime, mas não fala com ele sobre isso. Davi sabe o que se passa, mas decide ignorar a situação (2Sm 13.21). Para saber mais sobre filhos que decepcionam os pais, veja “Os filhos de Samuel decepcionam (1Sm 8.1-3)”.

Por dois anos, tudo parece ficar bem, mas conflitos não resolvidos dessa magnitude nunca desaparecem. Quando Amnom e Absalão viajam juntos pelo campo, Absalão embebeda seu meio-irmão com vinho e, em seguida, seus servos o matam (2Sm 13.28-29). O conflito atrai mais membros da família de Davi, os nobres e o exército, até que toda a nação acaba envolvida em uma guerra civil. A destruição causada por evitar o conflito é muitas vezes pior do que o desagrado que pode ter resultado de lidar com os problemas quando eles surgem.

Os professores de Harvard Ronald Heifetz e Marty Linsky descrevem como os líderes devem “orquestrar o conflito”, ou então ele se desenvolverá por conta própria, frustrará seus objetivos e colocará em risco suas organizações. [1] Da mesma forma, Jim Collins dá o exemplo de Alan Iverson, que era CEO da Nucor Steel em uma época em que havia profundas divisões sobre se a empresa deveria ou não diversificar para a reciclagem de sucata de aço. Iverson trouxe as divisões à tona, permitindo que todos expressassem sua opinião, protegendo-os de represálias de outros que pudessem discordar. Os “debates acalorados” que se seguiram foram desconfortáveis ​​para todos. “As pessoas gritavam. Acenavam com os braços e batiam nas mesas. Os rostos ficavam vermelhos e as veias saltavam.” Mas reconhecer o conflito e trabalhá-lo abertamente impediu que ele se tornasse clandestino e explodisse mais tarde. Além disso, ao trazer à tona uma variedade de fatos e opiniões, o grupo foi levado a tomar as melhores decisões. “Os colegas entravam no escritório de Iverson e gritavam uns com os outros, mas depois chegavam a uma conclusão... A estratégia da empresa ‘evoluiu por meio de muitas discussões e brigas agonizantes’.” [2] Um conflito bem orquestrado pode, na verdade, ser uma fonte de criatividade.

Davi aprende que precisa da orientação divina de como fazer sua obra (1Crônicas 13)

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Em 1Crônicas 13, Davi enfrenta um desafio em seu trabalho como rei e logo começa a resolvê-lo. Ele acredita que a arca de Deus deveria ser trazida de volta de Quiriate-Jearim, onde foi deixada durante o reinado de Saul. No entanto, em vez de agir por conta própria, ele conferencia com todos os seus líderes e ganha a concordância deles. Juntos, eles oram a Deus por sabedoria e concluem que realmente precisam trazer a arca de volta. É fácil para um líder cometer o erro de sair sozinho, sem o conselho de Deus ou de outras pessoas. Davi faz bem em reconhecer a necessidade de conselhos humanos e divinos. Ele recebe uma clara aprovação para seu projeto.

Mas o desastre ocorre. Uzá, que está ajudando a transportar a arca, põe a mão sobre ela para segurá-la, e Deus o mata (1Cr 13.9-10). Isso deixa Davi com raiva (1Cr 13.9-11) e com medo de Deus (1Cr 13.12), o que leva Davi a abandonar o projeto. O que começa como uma confirmação de Deus e de pessoas de confiança para realizar um projeto, de repente se transforma em um fracasso dramático. O mesmo acontece hoje. Por fim, quase todos nós experimentamos um doloroso revés em nosso trabalho. Pode ser profundamente desencorajador, e até ficamos tentados a abandonar a obra que Deus nos chamou para fazer.

No que parece ser um parêntese, Davi trava duas batalhas bem-sucedidas. Ele pergunta ao Senhor em cada caso se deve prosseguir, Deus o envia e ele obtém sucesso nas duas vezes. Mas a orientação de Deus para a segunda missão contém uma instrução peculiar. Deus diz: “Não ataque pela frente, mas dê a volta por trás deles e ataque-os em frente das amoreiras” (1Cr 14.14). Deus queria que Davi fosse, mas ele queria que ele fosse de uma maneira particular.

Depois desses sucessos, Davi reflete sobre essa experiência e ordena que ninguém, exceto os levitas, carregue a arca de Deus, porque o Senhor os escolheu para a tarefa (1Cr 15.2). Isso estava escrito no livro da Lei (Nm 4.15), mas havia sido esquecido ou negligenciado. Depois que Davi reúne os levitas para completar o trabalho de mover a arca, ele fala sobre o fracasso anterior: “Pelo fato de vocês [sacerdotes e levitas] não terem carregado a arca na primeira vez, a ira do Senhor, o nosso Deus, causou destruição entre nós. Nós não o tínhamos consultado sobre como proceder” (1Cr 15.13). Na segunda vez, porque eles seguiram o procedimento prescrito pela Lei, a arca foi movida com sucesso.

Esta história é um lembrete para nós em nosso próprio trabalho. É importante consultar a Deus e obter conselhos de pessoas de confiança sobre o que devemos fazer. Mas isso não é suficiente. Deus também se importa com como nós fazemos o trabalho. Como mostra a campanha fracassada de Davi, que negligenciou Números 4.15, fazer as coisas à maneira de Deus requer um conhecimento prático das Escrituras.

A desobediência de Davi a Deus causa uma praga nacional (1Crônicas 21.1-17)

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Davi também sofre outro fracasso que, para nós, no século 21, pode parecer estranho. Ele faz um censo do povo de Israel. Embora isso pareça prudente, o texto bíblico nos diz que Satanás incitou Davi a fazer isso, contrariando o conselho de Joabe, general de Davi. Além disso, a iniciativa “foi reprovada por Deus, e por isso ele puniu Israel” (1Cr 21.7).

Davi reconhece seu pecado ao fazer um censo contra a vontade de Deus. Como castigo, ele pode escolher entre três opções, cada uma das quais prejudicaria muitos no reino: (1) três anos de fome, ou (2) três meses de devastação pela espada de seus inimigos, ou (3) três dias de praga sobre a terra. Davi escolhe a terceira opção. Resultado: setenta mil pessoas morrem quando um anjo da morte passa pela terra. Diante disso, Davi clama a Deus: “Não fui eu que ordenei contar o povo? Fui eu que pequei e fiz o mal. Estes não passam de ovelhas. O que eles fizeram? Ó Senhor meu Deus, que o teu castigo caia sobre mim e sobre a minha família, mas não sobre o teu povo!” (1Cr 21.17).

Assim como Davi, provavelmente achamos difícil entender por que Deus puniria 70.000 outras pessoas pelo pecado de Davi. O texto não responde. Podemos observar, no entanto, que as transgressões dos líderes inevitavelmente prejudicam seu povo. Se os líderes empresariais tomarem más decisões sobre o desenvolvimento de produtos, as pessoas em sua organização perderão seus empregos quando as receitas despencarem. Se o gerente de um restaurante não aplicar as regras de saneamento, os clientes ficarão doentes. Se um professor der boas notas por um trabalho ruim, os alunos serão reprovados ou ficarão para trás no próximo nível de ensino. Aqueles que aceitam posições de liderança não podem fugir da responsabilidade pelos efeitos de suas ações sobre os outros.

O apoio de Davi às artes musicais (1Crônicas 25)

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1Crônicas acrescenta um detalhe não encontrado em 2Samuel e 1Reis. Davi cria um corpo de músicos para “ministrar a música no templo do Senhor”.

Todos esses homens estavam sob a supervisão de seus pais quando ministravam a música do templo do Senhor, com címbalos, liras e harpas, na casa de Deus. Asafe, Jedutum e Hemã estavam sob a supervisão do rei. Eles e seus parentes, todos capazes e preparados para o ministério do louvor do Senhor, totalizavam 288. (1Cr 25.6-7)

Manter um conjunto do tamanho de duas orquestras sinfônicas modernas seria um grande empreendimento em uma nação emergente no século 10 a.C. Davi não considera isso um luxo, mas uma necessidade. De fato, ele o ordena em seu papel de comandante-em-chefe do exército, com o consentimento dos outros comandantes (1Cr 25.1).

Muitos corpos militares ainda hoje mantêm bandas e corais, mas isso é raro de ver em outros ambientes de trabalho, a menos que sejam organizações musicais. No entanto, há algo na música e nas outras artes que é essencial para o trabalho de todos os tipos. A criação de Deus — a fonte da atividade econômica humana — não é apenas produtiva, é bela (por exemplo, Gênesis 3.6; Salmos 96.6; Ezequiel 31.7-9), e Deus ama belas obras (por Há lugar para a beleza em seu trabalho? Você, sua organização ou as pessoas que fazem uso de seu trabalho se beneficiariam se seu trabalho criasse mais beleza? Qual o significado de beleza para o trabalho em sua ocupação?